Postagens

TODA LUZ QUE NÃO PODEMOS VER

Imagem
Somos cidadãos de Saint-Malo em primeiro lugar, dizem os moradores. Depois, bretões. Franceses, em última alternativa. Maldições, ele lhe assegura, não existem. Existe sorte, talvez, boa ou má. Cada dia com uma leve inclinação ao sucesso ou ao fracasso. Mas maldições, não. Então, crianças, como o cérebro, que vive sem uma centelha de luz, constrói para nós um mundo tão iluminado?” “Abram os olhos”, conclui o homem, “e vejam o máximo que puderem antes que eles se fechem para sempre”. O pai lhe diz para refrear a imaginação. Pedras são apenas pedras, chuva é apenas chuva e maldições são apenas má sorte. Cada vez que Marie-Laure repete algum boato para o pai, ele diz que todo mundo se lembra da última guerra, e ninguém é louco o suficiente para passar por aquilo de novo. — Quase todas as espécies que já existiram estão extintas, Laurette. Não há motivo para pensar que conosco, seres humanos, será diferente! Rádio: ele une milhões de ouvidos a uma única boca. A voz sincopada do Reich cresc

A ODISSEIA DE PENÉLOPE

Imagem
( Com um bônus no final ) O caráter do “ardiloso Odisseu” tem sido muito comentado: ele ganhou fama de mentiroso persuasivo e mestre nos disfarces. Você gostaria mesmo de ler a mente? Pense bem. [ Eu pensei bem e não gostaria ] Não refutava, não fazia perguntas inconvenientes, não me aprofundava. Queria finais felizes naquela época, e os finais felizes são alcançados quando mantemos certas portas trancadas e dormimos na hora da confusão. [ Se é que se pode chamar anulação de felicidade ] Sempre fui determinada. Paciente, diziam. Gosto de ver o final da história. Nascemos dos pais errados. De pais pobres, pais escravos, pais camponeses e pais servos; pais que nos venderam, pais de quem nos roubaram. Quando chorávamos, ninguém enxugava nossas lágrimas. Se dormíssemos, nos acordavam a pontapés. Se nossos donos, seus filhos, um nobre visitante ou os filhos dele quisessem deitar conosco, não poderíamos recusar. Isso tudo aconteceu conosco quando éramos crianças. Se fôssemos lindas cria

O DEMONOLOGISTA

Imagem
Qual é o verdadeiro fruto do pecado original? Individualidade! Passei minha carreira dando aulas sobre coisas nas quais não acredito. Um ateu estudioso da Bíblia. Um especialista em demônios que acredita que o mal é uma invenção humana. Nunca vi um truque de mágica que não conseguisse decifrar. [ Talvez esse seja o tipo ideal de pessoa para dar aulas sobre esse e outros temas que envolvem religião e crença ] Há coisas que têm um significado, cultural, mesmo sem existir. [ E não são poucas, eu diria ] A mente é onde eles habitam, e nela Podemos fazer do inferno um paraíso, do paraíso um inferno Este é John Milton, falando por meio de Satã, sua ficção mais brilhante. [ Vale para todos os deuses e demônios ] Outro ano passou (e, com ele, mais um doloroso clique no hodômetro pessoal). Você é um especialista do nada. Um vácuo que anda e fala. [ Descreve muitas pessoas que estudam anos e anos para se tornarem apenas idiotas com diploma ] Eu não admito a existência de demônios, como não

QUE BOBAGEM!

Imagem
    UM MODO DE OLHAR PARA O MUNDO   Na maioria dos debates, da mesa do bar ao plenário do Congresso Nacional, ter a ciência ao seu lado é quase sinônimo de “ estar certo ”. Dizer-se “ científico ” é reivindicar atenção, prestígio, um espaço privilegiado na mídia e no olhar do poder público. [ A gente vê muito disso, ao mesmo tempo em que criticam a “incapacidade” da ciência que “não sabe tudo”, as pessoas adoram citar cientistas que estão de alguma forma corroborando suas crenças, por mais absurdas que elas sejam ].   O prestígio a que a ciência faz jus vem de sua atitude fundamental de respeito pela totalidade da evidência – principalmente pela parte que contradiz aquilo em que gostaríamos de acreditar – e de abertura à revisão crítica.   Quando a atitude científica básica é posta de lado, o que se obtém – e não importa quantos PhDs, MDs ou prêmios Nobel estejam envolvidos – é pseudociência: uma falsificação, uma impostura. Algo que se arroga a credibilidade, o prestíg