LIBERTO DA RELIGIÃO: O Inestimável Prazer de Ser Um Livre-Pensador

 


Paulo Beitencourt


Vamos em frente que atrás vem crente.

Todas as religiões se resumem nisto: acreditar na existência de coisas de que não se tem evidências. Uma análise do Cristianismo é quase uma análise do Islã. Onde não há reflexão, há manipulação. Toda ideologia que ameaça de castigo quem a rejeita é perversa e merece ser rejeitada.

Se a vida fosse um teste divino ele não seria justo.

Piscando como o letreiro de néon dum cassino de Las Vegas, duas palavras saltam aos olhos de quem, livre de viés religioso, reflete sobre a concepção de Deus ensinada por muitas religiões: infantilidade e sadismo.

Demos a alguém que nunca tenha ouvido falar da Bíblia o capítulo 28 de Deuteronômio para ler e certamente pensará tratar-se do roteiro dum filme de terror.

Pelo menos 60 versículos da Palavra de Deus se dedicam a convencer o leitor de que o deus que castiga quem não o adora é bom, claro sinal de que isso não fica evidente.

Destruição, perdição e Inferno estavam entre os temas preferidos de Jesus. Como um pastor neopentecostal, Jesus não conseguia ficar muito tempo sem citar Diabo, demônios e castigo divino.

Que instrumento de manipulação poderia ser melhor que esse? Não é necessário ser muito esperto para perceber que há uma relação entre Deus, religião, igreja, autoridade, medo e submissão. A essa relação junte-se comércio e fica ainda mais fácil entender por que liderar uma igreja é tão tentador.

Quando alguns israelitas se voltavam para outros deuses, o que acontecia com frequência, a divindade inventora do livre-arbítrio encarregava alguém de passá-los “ao fio da espada”.

Fala-se muito no lado feio da Igreja Católica, mas nunca no lado feio da Reforma Protestante. O Protestantismo foi tão intolerante e cruel quanto a igreja de que se separara com o propósito de ser um Cristianismo melhor. O reformador Martin Luther, ou Martinho Lutero, é retratado como um cristão exemplar, um verdadeiro herói da fé com lugar garantido no Céu.

Como a Igreja Católica, a Igreja Evangélica não tem e nunca teve problema algum com antissemitismo. Lutero odiava judeus com tal ferocidade que, em 1543, chegou a publicar um livro intitulado Von den Juden und Ihren Lügen (Sobre os Judeus e Suas Mentiras), em que incita à queima de suas sinagogas e casas. Era vontade do Pai da Reforma que os judeus fossem tratados como ciganos (outro povo por quem sentia asco). O antissemitismo de Lutero foi tão inflamado que no livro Mein Kampf (Minha Luta) Adolf Hitler exalta o monge como um de seus maiores ídolos.

Em seguida à tomada de poder por Hitler, o respeitado teólogo evangélico Emanuel Hirsch, especialista em Kierkegaard e autor de vários livros, escreveu: “Nem uma única nação possui um estadista como o nosso, que leva o Cristianismo tão a sério. Em 1933, Friedrich Otto Dibelius, uma das personalidades mais importantes do Protestantismo, pregou enaltecendo a política nazista de perseguição a judeus e outros grupos.

Um dos casos mais perturbadores e embaraçosos é o de Walter Hoff, pastor da Igreja Luterana e membro do movimento Deutsche Christen (Cristãos Alemães). Em 1940, Hoff se alistou na Wehrmacht, as forças armadas de Hitler, indo combater na Frente Oriental, onde foi condecorado com a Cruz de Mérito de Guerra. Gabou-se de sua devoção ao Nazismo: “Na Rússia soviética, ajudei a liquidar um número considerável, quer dizer, muitas centenas de judeus”. Terminada a guerra a Igreja Luterana designou Hoff para o posto de conselheiro espiritual num hospital próximo a Hamburgo.

Billy Graham, considerado o maior evangelista do mundo, tinha uma fortuna de dar inveja a qualquer evangélico, avaliada em 25 milhões de dólares, foi amigo e conselheiro de vários presidentes americanos, entre eles Richard Nixon, aquele que, na Guerra do Vietnã, expandiu os combates para os países vizinhos, cobrindo o Camboja com um tapete de bombas. Um memorando que o pastor Graham escrevera a Nixon veio a público. Estimula Nixon a bombardear as barragens norte-vietnamitas. Segundo estimativas, essa investida teria resultado na morte de um milhão de pessoas.

Erasmo de Rotterdam, também era crítico da decadência na Igreja Católica, porém a agressividade do radicalismo luterano o repelia. Seu distanciamento enfureceu o reformador: “Quem esmaga Erasmo estrangula um percevejo, que morto fede mais que vivo”.

Sobre o extremismo de Lutero, Stefan Zweig, escritor austríaco escreveu: “Esse homem combativo não tolera outro fim dum conflito senão a absoluta e incondicional aniquilação de seu adversário”.

Em 1524, influenciados por ideais reformadores, camponeses se uniram para reivindicar o fim de sua exploração e opressão pela aristocracia. Martinho Lutero foi direto ao assunto: “Quem puder deve espatifá-los, estrangulá-los e esfaqueá-los, secreta e publicamente, como se deve matar um cachorro louco a pauladas”. Com o aval e apoio moral dos reformadores, a aristocracia reprimiu a revolta rural com tal rigor que cerca de 100.000 campônios foram massacrados no que ficou conhecido como a Guerra dos Camponeses. Nenhuma de suas reivindicações foi implementada. Por influência direta de Calvino, 34 pessoas acusadas de magia negra foram queimadas na fogueira.

Castellion condenou a postura inflexível e impiedosa de Calvino, “Matar um homem não significa defender uma doutrina. Significa matar um homem”. Para ele, a Igreja Reformada em nada diferia da Inquisição Católica. Castellion é considerado um grande precursor da tolerância religiosa e liberdade de consciência.

Defenestração quer dizer “atirar alguém pela janela”. A primeira defenestração se deu em 1419, quando protestantes revoltados invadiram o prédio da prefeitura de Praga para exigir a soltura de correligionários. Atiraram o prefeito e nove servidores públicos janela abaixo. Quem não morreu na hora foi apunhalado pela turba que esperava em frente ao prédio. A segunda defenestração ocorreu quase duzentos anos mais tarde. Cerca de duzentos protestantes invadiram o Castelo de Praga e jogaram três secretários da corte pela janela. Essa defenestração deu o pontapé inicial à Guerra dos Trinta Anos.

O batismo infantil nunca foi um princípio combatido pelos reformadores. Mesmo assim, muitos evangélicos o consideravam anti-bíblico e se rebatizavam, motivo por que foram chamados de anabatistas. Os anabatistas se recusavam a pegar em armas e eram contrários à união entre Igreja e Estado, algo que a Reforma fazia questão de manter. Foram dura e longamente perseguidos em toda a Europa também pelo Protestantismo.

O que Calvino era para Genebra Zuínglio, era para Zurique. Zuínglio condenou as doutrinas anabatistas. O Anabatismo seria punido de morte.

Felix Manz se tornou um dos fundadores do Anabatismo. Manz foi o primeiro evangélico suíço a ser martirizado pelas mãos de outros evangélicos.

Baseando-se em textos de Lutero, em 1530 Filipe Melâncton redigiu a Confissão de Augsburgo, lê-se: “Malditos são os anabatistas”. Do artigo 16 consta: “Cristãos podem punir malfeitores com a espada e fazer guerras”. Ainda hoje é o credo oficial da Igreja Luterana.

Perseguição, tortura e condenação à morte ocorreram em muitas cidades evangélicas da Europa. Tanto Lutero quanto Calvino foram enérgicos defensores e promotores da caça às bruxas, que tirou a vida de cerca de 70.000 pessoas.

Durante os séculos em que a Península Ibérica esteve sob dominação islâmica Judaísmo e Cristianismo podiam ser praticados livremente. Em 1492, os cristãos expulsarem os muçulmanos, os judeus foram proibidos de seguir sua religião. Não seguir a religião do amor de Cristo significava morte certa.

Assim como a Igreja Católica faz com a Inquisição, a Evangélica intenta relativizar o lado negro de sua história, justificando-o. Na Áustria e Alemanha, o genocida Hitler ainda é admirado por muita gente, pois ele teria melhorado a condição de vida das pessoas e combateu o Comunismo. O mesmo se dá com o exterminador Stalin, ainda reverenciado por muitos como herói, sobretudo por industrializar a Rússia e derrotar Hitler.

Em 2016, o Brasil inteiro viu e ouviu pela TV o deputado federal católico Jair Bolsonaro fazer apologia à tortura. Apesar disso é idolatrado por milhões de seguidores de Cristo, que, em 2018, elegeram-no presidente da República.

A que o caro leitor associa o nome Jaime I da Inglaterra? Exato, à Bíblia do Rei Jaime, mais conhecida como King James Version, uma das mais conceituadas traduções das Sagradas Escrituras. Em 1590, em Edimburgo, o evangélico James estabeleceu um tribunal para julgar 70 pessoas denunciadas por feitiçaria. O rei esteve presente às sessões de tortura e pessoalmente conduziu os interrogatórios de vários dos réus.

Jesus disse que os filhos de Deus são os pacificadores, mas se é que o Cristianismo um dia foi pacífico, isso foi antes de se tornar a religião dominante do Império Romano. Apenas nos Estados Unidos mais de 120 milhões de cristãos são proprietários de revólveres, espingardas, rifles, fuzis, etc.

Amem os seus inimigos e orem por aqueles que os perseguem, (Mateus 5:39,44-45). Ora, é impossível amar os inimigos e ao mesmo tempo usar armas contra eles.

No auge de suas hediondas atividades, a organização racista americana Ku Klux Klan chegou a ter cerca de seis milhões de adeptos, quase todos protestantes. Dois terços de sua liderança têm se constituído de pastores evangélicos.

Grupos radicais cristãos não existem em função de mera insanidade mental, mas porque a religião judaico-cristã contém elementos que dão margem a concepções extremistas. Seria difícil para o KKK basear sua ideologia supremacista na Bíblia, se esta não ensinasse que escravidão é legal e o plano de Deus inclui ele ter separado pessoas para serem exaltadas como seu povo escolhido, que ele revestiu de poderes para praticar limpeza étnica contra outros povos e usurpar suas terras.

Embora tenha sido perseguido pelo Império Romano, assim que ascendeu ao posto de religião dominante o Cristianismo se tornou ele mesmo perseguidor.

O lema do brasão de Cromwell era “A paz se busca pela guerra”. Bem ao estilo das batalhas bíblicas, tinha convicção de que suas investidas bélicas eram guiadas por Deus.

Se o objetivo de Martinho Lutero foi purificar o Cristianismo do que considerava falsas doutrinas da Igreja Católica, para João Calvino essa purificação não fora suficientemente profunda. Mesmo assim, dentro do Calvinismo havia aqueles que o queriam ainda mais fundamentalista, isto é, puro. Esse movimento ultraconservador ficou conhecido como Puritanismo e teve seu apogeu durante a ditadura militar do puritano Oliver Cromwell. Assim definiu o jornalista americano Henry Louis Mencken o Puritanismo: “Medo assombroso de que alguém, em algum lugar, possa ser feliz”.

À moda daquilo que foi um dos principais motivos para o surgimento do Protestantismo — a venda de indulgências —, a Teologia da Prosperidade, marca registrada do Neopentecostalismo, não passa de comércio de favores divinos. Enquanto a Igreja Católica vendia a remissão das assim chamadas penas temporais, pastores neopentecostais comercializam promessas de milagres, sucesso e fortuna. O interessante na Teologia da Prosperidade é que realmente funciona — para aqueles que a vendem.

Em geral, as diversas denominações evangélicas mutuamente se desprezam, mas quando é para demonizar a Igreja Católica elas curiosamente se unem como se se amassem. Enquanto a maioria dos católicos nasceu no Catolicismo e apenas prossegue na tradição religiosa de seus pais, muitos evangélicos “nasceram de novo”, quer dizer, converteram-se, uma experiência que os faz ter um vínculo mais estreito com sua igreja. Isso resulta num dogmatismo e fundamentalismo que não são muito comuns entre católicos.

O que deveria ser a coisa mais natural do mundo — viver sem religião — é visto como algo vil. Muitos religiosos têm suas religiões como indispensáveis. Não lhes é possível conceber que alguém possa ter razões legítimas para delas não querer fazer parte, quanto mais deixá-las. Quem acha que filhos de pais evangélicos são livres para deixar a igreja sem constrangimento algum desconhece a realidade.

O que seria das religiões, se toda gente aceitasse o óbvio, ou seja, o fato de ninguém saber se esse tal de Céu existe? O Céu não existe até que se prove o contrário. Não deveria esse ser o modo natural de pensar? Muita coisa é possível, inclusive universos paralelos. O caro leitor acredita em universos paralelos, correto? Não? Estranho, pois não são poucos os cosmólogos que afirmam que é possível haver outros universos. Mesmo assim, nenhum físico seria louco de afirmar que universos paralelos realmente existem. Como vida após a morte, Céu e Inferno, o Multiverso não passa de especulação, pois dele não temos evidências.

O caro leitor já viu um padre ou pastor intelectualmente honesto? Eu também não, pois para serem intelectualmente honestos padres e pastores teriam de começar um sermão assim: “Irmãs e irmãos, se existir, imagino que Deus repudia pessoas desonestas. Por isso, a partir de agora falarei só de coisas que sei que existem. Quantos membros teriam as igrejas cujos padres e pastores fossem intelectualmente honestos?

Religiosos não estão interessados na verdade, pois a verdade é que, até que se prove o contrário, Deus, deuses, anjos, Diabo, demônios, vida eterna, Céu e Inferno não existem.

Reveses, sofrimento e inconformação com a morte levam pessoas a fugir da realidade, e buscar consolo e esperança nas religiões. Isso não seria de todo reprovável, não fosse o fato de religiões induzirem seus seguidores a ter medo de rejeitar alguém que ninguém sabe se existe. Vida eterna e Paraíso seriam esperanças inofensivas, se não estivessem intrinsecamente ligadas à nefasta noção de povo escolhido, que leva sócios dum clube a achar natural que pessoas sejam castigadas por serem sócias de outros clubes, ou de nenhum.

Há várias falhas nessa Aposta de Pascal. A principal é que se aplica a qualquer divindade de qualquer religião. A Aposta de Pascal é excelente para demonstrar como o medo é a essência da maioria das religiões, é melhor crer em Deus que arriscar ser torturado num lago de fogo e enxofre. Em outras palavras, tenha, medo de não crer em Deus. Se decidiu não arriscar e já crê em Deus, tenha medo de não estar crendo no deus verdadeiro. Se está convicto de que crê no deus verdadeiro, tenha medo de não o estar fazendo da maneira certa. Quer ter certeza de estar crendo no deus verdadeiro da maneira certa? Nada mais simples: basta se tornar membro da igreja verdadeira. Ah, você não sabe qual das 40.000 denominações cristãs é a verdadeira? Não se desespere. Ninguém sabe. Então, pegue qualquer uma. Depois, é só torcer para que seja a que representa o deus verdadeiro da maneira certa. Ou faça como eu: reconheça a irracionalidade disso tudo e relaxe. Se é verdade que Deus nos deu livre-arbítrio então é equivocada a noção de que ele castigará quem nele não crê, pois descrer não é maldade. Do contrário, cristãos são maus por não acreditarem em Odin, o deus nórdico, pai de Thor. Deus seria um tirano se mandasse alguém para o Inferno apenas por não crer. Se Deus existir, quem não vê evidências de sua existência e nele não crê pelo menos nada faz que o represente de forma errônea, deturpada. Um religioso pode estar o tempo todo ensinando falsidades sobre ele e em seu nome cometendo absurdos. Thomas Jefferson, “Atreva-se a questionar até a existência de Deus, pois, se existir, ele certamente prefere a razão ao medo cego”.

O Cristianismo é tão lógico ou irracional, concebível ou implausível, sério ou risível quanto qualquer outra crença religiosa. Por que tanta gente segue o Cristianismo, apesar de seus elementos evidentemente bizarros? Dos vários motivos, penso que fatores sócio-culturais são os principais. Visto ser passada de pais para filhos, estamos perfeitamente acostumados à religião predominante do país em que nascemos. Outro motivo parece ser a necessidade de muita gente de se sentir protegida e amparada, que é satisfeita pela convicção de que Jesus com ela se importa. Além disso, o Cristianismo dá sentido à vida de seus adeptos, pois os faz achar que sabem de onde vieram e para onde vão. E ao convencê-los de que pertencem ao povo escolhido por ninguém menos que o Criador do Universo para deter a verdade, o Cristianismo ainda os faz sentirem-se especiais.

A ânsia de muitas pessoas por encontrar respostas a suas dúvidas ligadas a um suposto transcendente é tanta que de bom grado se submetem a quem alega tê-las. Isso explicaria por que é tão fácil impor-se como líder espiritual e atrair discípulos.

O Universo não é, então, apenas gigantesco. É inimaginavelmente mais que super colossal. São dimensões que nossa mente não tem capacidade para processar. Em face disso, como poderia ser coerente a concepção da maioria dos cristãos de que só a Terra é habitada? a probabilidade de que exista vida em outros planetas é muitíssimo maior que a de que existam deuses, anjos e demônios, pois, se existem, extraterrestres pertencem ao mundo natural.

Vida extraterrena é talvez a descoberta mais extraordinária que a Humanidade possa fazer, pois, ainda que na forma duma simples bactéria, transformaria nossa visão de nós mesmos e do Cosmos. Na existência de extraterrestres não é necessário ter fé. Ou existem ou não. Se a Humanidade aceitasse a falta de evidências da existência de divindades com a mesma naturalidade com que aceita a falta de evidências da existência de alienígenas, religiões não existiriam.

A propósito, se existe, por que Deus precisa pertencer à esfera sobrenatural? sua existência deveria ser tão óbvia que ninguém conseguiria duvidar. Haveria milhões de evidências dum deus, e não milhares de religiões exigindo fé em milhares de deuses.

É preciso crer no deus verdadeiro, seguir a religião verdadeira, ser membro da igreja verdadeira e praticar da maneira certa. A absurdez dessa concepção é evidente, sobretudo porque cada religião alega ser a verdadeira representante do verdadeiro deus.

Hoje, há cerca de 40.000 denominações cristãs que mais ou menos se desprezam, hostilizam e combatem. Se crer em Jesus fosse mesmo a única coisa que importasse, não só não haveria tanto antagonismo entre as igrejas como também não faria a menor diferença nem se um cristão vai à igreja nem a qual vai.

Embora cristãos gostem de pensar que o Cristianismo é a religião mais lógica, sua fragmentação em inúmeras seitas evidencia justamente o contrário. O Cristianismo não aboliu a doutrina judaica de povo escolhido, apenas transferiu sua validade para os crentes em Cristo. Todavia, até sobre isso a comunidade cristã diverge amplamente.

Jesus prefere adoradores de deuses rivais a ateístas. Inclusivismo e universalismo não passam de tentativas de fazer o Cristianismo parecer mais simpático, o próprio apóstolo Paulo não deixa dúvida: “Ele punirá os que não conhecem a Deus e os que não obedecem ao evangelho de nosso Senhor Jesus. Eles sofrerão a pena de destruição eterna” (Tessalonicenses 1:7-9).

Curiosamente, por 4.000 longos anos ninguém precisou crer em Jesus para ser salvo. Após seu nascimento, porém, a fé em Cristo se tornou requisito indispensável para que alguém se qualifique a ir para o Céu.

Para religiosos, descrer é um ato vil. É central no Cristianismo e Islã a ideia de que descrença é rebeldia. Como comprova a História, isso faz deles as religiões mais intolerantes.

Não é verdade que a Natureza aponta para a existência dum deus nos moldes do deus bíblico. Inicialmente, o próprio povo judeu não foi monoteísta, mas politeísta. A princípio Yahweh era apenas uma das várias deidades adoradas pelos hebreus. Fazer de Yahweh o único deus do povo judeu foi um processo gradual que levou vários séculos, concluído só após o retorno do Exílio Babilônico.

Duvidar da existência duma divindade que se esconde é perfeitamente natural. Se o ser humano não tem desculpas para não crer em Deus, que desculpas tem Deus para não revelar ao ser humano, por exemplo, a fórmula para a cura do câncer?

A exuberância da Natureza é frequentemente usada por religiosos como argumento para comprovar a existência de Deus. Quando batem nessa tecla, conferem à Natureza qualidades humanas e focam única e exclusivamente nas positivas. Se há uma inteligência divina por trás das abelhas, é a mesma que está por trás também das plantas carnívoras, de cujo cardápio, por sinal, as abelhas fazem parte. Os reinos animal e vegetal não seriam o que são, se na Natureza não fosse comum a arte de enganar, ludibriar, trapacear, fingir e disfarçar, tão imprescindível para a sobrevivência da maioria das espécies. Ora, se a Natureza é imperfeita e não houve evolução, essa imperfeição tem de ter origem em Deus. Se não houve evolução, então as astúcias predatórias peculiares de cada espécie de ser vivo foram concebidas pelo próprio Criador. Some-se a isso os desastres naturais, como terremotos, erupções vulcânicas, furacões e impactos de asteroides. Sem evolução, Deus é o criador de toda imperfeição que há não só na Terra mas também no Universo inteiro, Deus tem de estar por trás ainda de todas as bactérias e vírus que causam doenças e ser o programador de instintos animais que nos perturbam por nos parecerem cruéis, como o de leões, que, quando conquistam a liderança dum grupo, matam os filhotes de seus antecessores. Cristãos vivem num paradoxo.

Cristãos fundamentalistas, rejeitam a Evolução. Creem que o Diabo é o responsável por tudo que há de errado e ruim. Querendo ou não, conferem a Satanás poderes que dele fazem um minideus. Malabarismo argumentativo é necessário para sustentar que um deus perfeito, não tem como produzir coisa alguma que seja fruto de imperfeição.

No hino All Things Bright and Beautiful (Todas as Coisas Brilhantes e Bonitas) cantado no mundo protestante, usando a Natureza para provar que Deus existe, dizem:

Todas as coisas brilhantes e bonitas,
todas as criaturas grandes e pequenas,
todas as coisas sábias e maravilhosas,
o Senhor Deus fez todas elas.

Cada florzinha que se abre,
cada passarinho que canta,
ele fez suas vivas cores,
ele fez suas asinhas.

Incomodados com essa parcialidade, o grupo Monty Python compôs uma versão intitulada All Things Dull and Ugly (Todas as Coisas Toscas e Feias):

Todas as coisas toscas e feias,
todas as criaturas baixas e atarracadas,
todas as coisas rudes e desagradáveis,
o Senhor Deus fez todas elas.

Cada cobrinha que envenena,
cada vespinha que aferroa,
ele fez sua brutal peçonha,
ele fez suas horrendas asas.

Todas as coisas doentias e cancerosas,
todo mal, grande e pequeno,
todas as coisas imundas e perigosas,
o Senhor Deus fez todas elas.

Cada vespãozinho repugnante,
cada lulazinha bestial.
Quem fez o espinhento ouriço?
Quem fez os tubarões? Foi ele.

Todas as feridas e úlceras,
todas as infecções, grandes e pequenas,
pútridas, fedorentas e gangrenosas,
o Senhor Deus fez todas elas.

Enquanto o Novo Testamento tem fixação pela pessoa do Diabo, referindo-se a ele muitas vezes, o Velho quase nunca o menciona. Supondo que o Universo tenha sido criado por um único deus, a ideia de que este é o autor não só do bem mas também do mal, como creem os judeus, é mais coerente.

A clássica explicação que literalistas bíblicos dão é: “Pecado”. Pecado explica todas as bizarrices da Natureza. Literalistas bíblicos fogem de muitos temas científicos pois lhes causam embaraço, arranham sua concepção de Deus e suscitam dúvidas. Refletir sobre a concepção bíblica de Deus é, para a maioria dos cristãos, o mesmo que dele duvidar, e quem dele duvida vai para aquele lugar invisível em que duvidadores são assados na brasa. “Dinossauros!” são um dos fatores que mais perturbam promotores da doutrina criacionista.

Como para os cristãos o deus bíblico pode fazer só o bem, precisam dum outro ser que seja responsável pelo mal. Visto não ser onipresente, sozinho Satanás não daria conta de causar todo mal que há no mundo. Por isso, é necessário imaginá-lo com capangas. Não se sabe quantos demônios “existem”, mas como na concepção cristã todo ser humano é alvo constante de tentações, deve haver pelo menos um demônio para cada terráqueo. O que acontecerá no dia em que o número de humanos superar o de demônios? Haverá um decréscimo na quantidade de pecados cometidos? Ou será que, para compensar, os capangas de Satanás trabalharão mais?

Já me peguei tentando imaginar quão chata deve ser a vida dum demônio. Milênio após milênio, não ter outra coisa para fazer senão atazanar pessoas. Ser um demônio deve ser uma tortura.

Se o Diabo tem poder para causar males e Deus é conhecedor do futuro e tem poder para evitá-los, mas não o faz, a divindade bíblica é cúmplice de Satanás. Deus de amor, Yahweh não perdoou seus filhos por darem uma dentada numa fruta. Mero ser humano, eu perdoo meu filho por fazer coisas muito piores. Preciso dizer mais?

Religiosos têm justificativas para cada uma das inúmeras incoerências e contradições de sua crença. Essas desculpas são ouvidas e repetidas tantas vezes que, apesar de evidentemente insatisfatórias, eles as têm como plausíveis. O ser humano nunca é escusável; Deus, sempre. “Deus sabe o que faz” é o botão vermelho de emergência que religiosos apertam sempre que a mente periga começar a raciocinar. Porque onde há devoção não há olhar crítico. Por tender a aniquilar a fé, a dúvida é a principal inimiga das religiões, é fácil fazer um cristão ter dúvidas religiosas sem sentir que está desafiando Deus. Basta dizer-lhe, por exemplo, que o Islã é a religião verdadeira. O cristão não só duvidará como até rirá. Duvidar de sua própria religião é pecado. Duvidar da religião dos outros é um dever.

Por mais incoerente, esquisito, ridículo, absurdo ou vil que um sistema de ideias seja, sempre haverá gente disposta a segui-lo e defendê-lo. Cristãos acreditam que Cristo está para voltar a qualquer momento. Paradoxalmente, vivem como se isso nunca fosse acontecer, esmerando-se tanto quanto qualquer não cristão por prosperar e ascender socialmente. Como não seria isso evidência de que eles mesmos estão pouco ou nada convictos do retorno de seu Mestre?

A despeito de todas as coisas erradas, em muitos aspectos o mundo hoje é melhor que no passado.

Imaginemos que ninguém jamais tivesse ouvido falar da Bíblia. Nem um único ser humano, como se o mundo sempre tivesse existido sem ela. Imaginemos que alguém passasse a espalhar que descobriu uns rolos de pergaminho que falam, entre outras coisas, dum boneco de barro que virou homem, duma costela que virou mulher, de seres invisíveis com asas nas costas empunhando espadas de fogo, dum homem que andava sobre as águas e com cinco pães e dois peixinhos alimentou uma enorme multidão e duma cidade cubiforme de 2.225 km de altura feita de ouro. Como reagiríamos? O que pensaríamos do descobridor desses rolos, se afirmasse acreditar em tudo que neles está escrito? Acharíamos plausíveis os relatos contidos nesses pergaminhos? Por que, então, para tanta gente essas histórias não soam como disparates, alucinações, insanidades? É simples: crescemos ouvindo-as. Um dos principais motivos por que tanta gente acredita nas histórias evidentemente fantásticas da Bíblia é o fato de ser um livro antigo. Se tivesse sido escrita nos nossos dias, uma esmagadora maioria não pensaria duas vezes antes de considerá-la uma obra de ficção. Outro motivo é tradição. Há centenas de anos vem sendo passado de geração a geração com o rótulo de sagrado. Em compensação, cristão algum acredita no que dizem textos religiosos até mais velhos que a Bíblia, já que, apesar de antigos, no Ocidente não foram rotulados de sagrados e como tais passados de pais para filhos.

No momento em que o assunto é religião, a coisa fica séria, muito, muito séria. Essa severidade é notória sobretudo nas religiões semitas Judaísmo, Cristianismo e Islã, das quais a imposição de medo através de ameaça de castigo é parte fundamental.

Se anjos existem e são como retratados em Daniel 10, é melhor torcer para não ser visitado por eles, pois as chances duma parada cardíaca são enormes.

A inconformidade com a finitude da vida, o almejo por uma vida paradisíaca e a ânsia por quem lhe diga o que deve fazer para alcançá-la levam muita gente a eximir as religiões de escrutínio racional, como se espiritualidade gozasse de posição privilegiada e fosse normal que estivesse acima da razão.

Religiões oferecem “respostas” a pessoas que acham que não ter respostas é mau. Há só um probleminha com as “respostas” oferecidas pelas religiões: não são respostas. Quem foi induzido a acreditar em Paraíso foi induzido também a achar normal pessoas serem torturadas num lago de fogo e enxofre. Dizer “Não sei” é nobre, visto que honesto. Richard Feynman, “Penso ser muito mais interessante viver não sabendo do que ter repostas que podem estar erradas”.

Literalistas bíblicos são uma minoria, cuja maior parte se encontra no Terceiro Mundo, justamente onde o nível de instrução da população é baixo. Entretanto, apesar de minoria, estamos falando de muitos milhões de fundamentalistas. Ainda que História, Arqueologia e Ciência lhes mostrem que estão erradas, igrejas fundamentalistas continuarão sendo fundamentalistas.

Quão provável é que uma divindade seja por um lado tão inteligente e poderosa a ponto de criar o Universo e por outro incapaz de encontrar um meio de se revelar de maneira tal que suas revelações sejam inequivocamente compreendidas por todas as pessoas de todas as épocas e culturas?

É, portanto, mais que natural achar estranho que a personalidade que causou o maior impacto na história da Humanidade não seja citada por fonte histórica alguma de sua época. As alusões extrabíblicas mais antigas ao homem que multiplicou pães não são mais que duas simples menções na vasta obra do historiador romano-judeu Flávio Josefo, pequenas demais para serem dignas duma figura que teria causado tanta comoção. Se o historiador realmente se referiu ao Mestre dos cristãos, fê-lo seis décadas, ou 60 longos anos, após sua morte. Para piorar, a cópia mais antiga de Antiguidades Judaicas é uma tradução latina realizada cerca de 400 anos mais tarde. Por esses e outros motivos, há amplo consenso entre historiadores e exegetas de que essas alusões a Jesus não passam de adições fraudulentas.

“Antes mesmo de ele nascer, já se sabia que seria uma pessoa especial. Um ser sobrenatural informou sua mãe de que o filho que ela conceberia não seria um mero mortal, mas um ser divino. Ele nasceu de maneira milagrosa e se tornou um jovem inusitadamente precoce. Quando adulto, deixou a casa dos pais e se tornou um pregador itinerante, incitando seus ouvintes a viver não pelos bens materiais deste mundo, mas por valores espirituais. Arrebanhou diversos discípulos a seu redor, pessoas que se convenceram de que seus ensinamentos tinham inspiração divina, até mesmo porque ele próprio era divino. Isso foi por ele provado com a realização de milagres, cura de enfermos, exorcismo de demônios e ressuscitação de mortos. Contudo, ao final de sua vida, despertou oposição, e seus inimigos o entregaram aos romanos para ser julgado. Depois de deixar este mundo, retornou para encontrar seus seguidores e convencê-los de que não estava realmente morto, mas vivendo no reino celestial. Mais tarde, alguns de seus seguidores escreveram livros sobre ele”. O texto acima foi escrito por Bart Ehrman, professor da Universidade da Carolina do Norte e uma das mais respeitadas autoridades em Novo Testamento, e reproduz exatamente o que foi difundido sobre Apolônio de Tiana, filósofo grego que teria sido contemporâneo de Jesus, porém na atual Turquia. Como o Nazareno, não se tem absoluta certeza se Apolônio realmente existiu. Mesmo assim, e por incrível que pareça, há mais evidências históricas dele que do Filho de Deus. Especialistas como Ehrman, são da opinião que, em virtude de suas inúmeras diferenças e erros, os Evangelhos não são fontes históricas confiáveis. O que Moisés, Buda, Jesus e Maomé têm em comum? A densa nuvem de obscuridade que os envolve.

A fuga dos hebreus do Egito, ou o Êxodo, é uma das narrativas bíblicas mais importantes para a fé judaico-cristã. Em 2014, Stephen Rosenberg, membro sênior do Albright Institute of Archaeological Research, em Jerusalém, publicou um artigo no jornal The Jerusalem Post intitulado O Êxodo: A Arqueologia Tem Algo a Dizer? A primeira frase do artigo é curta: “Não!”. Rosenberg afirma não haver nem uma única evidência arqueológica que sustente os relatos bíblicos: “Nada sobre a escravidão dos israelitas, nada sobre as pragas que convenceram o faraó a deixá-los ir, nada sobre a miraculosa travessia do Mar Vermelho, nada. Absolutamente nada”. À mesma conclusão chegou Israel Finkelstein, outro proeminente arqueólogo israelense.

Se nem rabinos, interpretam a Bíblia de modo literal por que, então, essa obsessão do Evangelicalismo pelo literalismo bíblico? tomar a Bíblia ao pé da letra não é outra coisa senão superstição e idolatria. Lewis Black, comediante: “Eu tenho… pensamentos. E eles realmente podem estragar essa coisa de fé”.

Claramente, educação reduz fundamentalismo.

Se o Universo foi criado por Deus e tudo que ele criou tem um propósito, qual o propósito dum espaço de tamanho inimaginável conter dois trilhões de galáxias com centilhões de planetas destituídos de vida? Na escala cósmica, a Terra é um átomo. Quem já viu a fotografia Pálido Ponto Azul, tirada em 1990 pela sonda espacial Voyager 1, sabe do que estou falando.

Afirmar que o deus bíblico, apesar de todo-poderoso e conhecedor do futuro, permite que crianças sejam sequestradas, torturadas, violentadas e assassinadas, é um deus de amor é mais que perversão: é loucura.

“Disse Deus.” Ao que parece, o deus bíblico gosta de falar sozinho. Aliás, por que precisou falar para que algo passasse a existir? Ainda no primeiro dia, Deus fez a luz e a separou das trevas, duas coisas que por natureza nunca se misturam e, portanto, não precisam ser separadas. Ervas e árvores foram criadas no terceiro dia, mas o Sol só no dia seguinte. A vegetação, então, foi criada um dia antes do Sol. Essa inversão da ordem lógica reforça o caráter fantasioso do relato. No quarto dia, Deus disse: “Haja luzeiros no firmamento dos céus, para fazerem separação entre o dia e a noite”, criando o Sol, a Lua e as estrelas. Entretanto, no primeiro dia Deus já criara a luz, fazendo “separação entre a luz e as trevas”. Bizarramente, por três dias houvera luz na Terra, embora o Sol ainda não existisse. Se os animais tinham sido criados em pares de machos e fêmeas, é ilógico Deus criar o ser humano só macho. Assim que criou o homem, “viu Deus tudo quanto fizera, e eis que era muito bom”, porém mais tarde se deu conta de que “não é bom” que o homem esteja só. Se a mulher não tivesse sido criada, Adão tivesse comido da árvore proibida e, como ensina o Cristianismo, redenção é possível só com o sacrifício do próprio Deus, ele teria de ter vindo morrer por uma Humanidade constituída de um único ser humano: Adão, que seria obrigado a pregar Jesus numa cruz.

“De toda árvore do jardim comerás livremente, mas da árvore do conhecimento do bem e do mal não comerás; porque, no dia em que dela comeres, certamente morrerás.” Nessa proibição há crueldade, por sinal um elemento comum em lendas. Que justificativa poderia haver para Deus fazer a Humanidade inteira sofrer por causa duma transgressão tão ingênua? Num mundo sem maldade, Eva e Adão nenhuma ideia faziam do que esses tais de bem e mal eram. Curiosidade, no entanto, é inerente à natureza humana. Que o primeiro casal iria fracassar era mais que previsível. Não só a punição mas também o próprio teste de obediência é desproporcional.

Se Deus criou o mundo perfeito, Eva e Adão eram perfeitos. Por conseguinte, não possuíam nem a menor predisposição para pensar maldosamente. O livre-arbítrio, é muito debatido tanto no meio filosófico quanto científico. Diversos neurocientistas afirmam que o livre-arbítrio é uma ilusão. Se Deus é onisciente e conhece o futuro, como pode o ser humano ser livre para escolher? Só podemos escolher o que existe para ser escolhido. Se o mal não existisse, ninguém poderia escolher praticá-lo. Eva e Adão possuíam a índole de crianças que em nada veem maldade. A própria Bíblia admite que Eva foi enganada. Ora, ser enganado nunca é uma ação deliberada, muito menos maldosa.

Cristãos nunca se perguntam se o que a serpente disse a Eva era mentira. O que a cobra disse e aquilo em que Eva acreditou era verdade. Logo, nem Eva, nem Adão, nem a serpente mereceram ser castigados, pois não cometeram maldades. Quem mentiu foi Deus.

Satanás, que atende também pelos nomes: Anhangá, Anhanguera, Arrenegado, Azucrim, Beiçudo, Bicho-Preto, Bode-Preto, Bute, Cafuçu, Cafute, Caneco, Canheta, Canhim, Canhoto, Cão, Cão-Miúdo, Cão-Tinhoso, CapaVerde, Capeta, Capiroto, Careca, Cifé, Coisa, Coisa à Toa, Coisa-Má, Coisa-Ruim, Condenado, Coxo, Cujo, Debo, Demo, Demônio, Diá, Diacho, Diale, Dialho, Dianho, Diogo, Dragão, Droga, Ele, Excomungado, Figura, Fute, Gato-Preto, Grão-Tinhoso, Indivíduo, Inimigo, Lúcifer, Maioral, Maldito, Mal-Encarado, Maligno, Malvado, Mau, Mofento, Mofino, Moleque, Não Sei Que Diga, Pé-Cascudo, Pé de Cabra, Pé de Gancho, Pé de Pato, Pé de Peia, Pero-Botelho, Porco, Porco-Sujo, Que-Diga, Rabão, Rabudo, Rapaz, Romãozinho, Sapucaio, Sarnento, Satã, Satânico, Serpente, Sujo, Temba, Tendeiro, Tentação, Tentador, Tição, Tinhoso e Tisnado.

Onde há perfeição, imperfeição não tem como surgir. Como, então, pôde Lúcifer sentir o que não existia para ser sentido? Num mundo sem pecado, ou perfeito, nada morria. Assim sendo, por que a mulher e o homem precisavam se alimentar? Se a morte não existia e Eva e Adão foram criados para viver eternamente, por que, então, precisavam respirar?

Assim que Eva e Adão deram a lendária dentada no fruto proibido, Deus introduziu em vegetais as substâncias tóxicas que os transformaram em plantas e frutas venenosas. Como não forneceu a lista delas, muita gente teve de passar mal e morrer para que tivéssemos conhecimento de seus venenos. Em sua braveza, Deus puniu os seres vivos com a eliminação da imortalidade e o homem com vida árdua. Não havia, pois, necessidade alguma desse extra, de Deus injetar veneno na vegetação. Ao fazer isso, demonstrou seu caráter sádico.

“O teu desejo será para o teu marido, e ele te governará.” É mais que evidente que a intenção do autor desse relato é criar uma legitimação, quer dizer, desculpa para a dominação masculina das mulheres, estabelecendo-a como vontade não dos homens, mas de Deus, a que eles são obrigados a obedecer. Claramente, na Igreja Católica e em grande parte das inúmeras ramificações do Evangelicalismo as mulheres não podem ser ordenadas e exercer o ministério pastoral. Por incrível que pareça, as próprias mulheres cristãs parecem não ter problema algum com a maldição divina que as condenou a ser dominadas pelos homens.

Nos Dez Mandamentos, a mulher é uma possessão do homem tanto quanto seus bois, jumentos e escravos, mas mesmo assim não a mais importante, que, como se lê em Êxodo 20:17, é sua casa. Disse o Senhor a Moisés: “Diga aos israelitas: Quando uma mulher engravidar e der à luz um menino, estará impura por sete dias […]. Então a mulher aguardará trinta e três dias para ser purificada do seu sangramento […]. Se der à luz uma menina, estará impura por duas semanas […]. Nesse caso aguardará sessenta e seis dias para ser purificada do seu sangramento”. (Levítico 12:1-5). Mesmo sendo retratadas de maneira depreciativa na Bíblia e no Alcorão, mulheres são mais religiosas que homens.

Samuel Herd, membro do Corpo Governante das Testemunhas de Jeová, deixou bem claro o que o deus bíblico espera das mulheres: “Cientistas dizem que a capacidade craniana da mulher é 10% menor que a do homem. Isso mostra que simplesmente não está equipada para o papel de liderança”.

A verdade é que a Bíblia não menciona a sujeição da mulher como um mero reflexo dos costumes da época, limitados à cultura judaica, mas a apresenta como expressa vontade divina estabelecida na criação e consolidada no Novo Testamento pelos apóstolos, o apóstolo Paulo explica “o cabeça de todo homem é Cristo, e o cabeça da mulher é o homem”.

Num ato de extrema benevolência, Paulo concede que a mulher aprenda, desde que cale a boca. “A mulher deve aprender em silêncio, com toda a sujeição. Não permito que a mulher ensine, nem que tenha autoridade sobre o homem”. Martinho Lutero sobre elas assim discorre: Erva daninha cresce rápido, por isso meninas crescem mais rápido que meninos. Baseando-se sobretudo nas palavras de Paulo, a esmagadora maioria das denominações evangélicas condena a homossexualidade.

Por que, então, em muitas dessas igrejas às mulheres é permitido exercer cargos de liderança, pregar ou até ser pastoras, se com isso desobedecem ao mesmo apóstolo que reprova os homossexuais?

Num Estado laico, favorecer uma religião é inconstitucional. Se a Bíblia deve ser admitida em salas de aula, o mesmo privilégio precisa ser concedido a livros e tradições de outras religiões. Aliás, no caso de países como Brasil e Estados Unidos, não deveriam as crenças dos povos indígenas ter prioridade sobre uma importada do Oriente Médio?

Cada vez mais cristãos fundamentalistas adentram a política objetivando a criação e aprovação de leis baseadas em suas convicções religiosas. Ao mesmo tempo, a maioria dos cristãos abomina o fundamentalismo religioso em países como Afeganistão e Irã. Não seria o fanatismo das nações muçulmanas resultado justamente de nelas não haver verdadeira separação entre Igreja e Estado?

Não só Judaísmo e Cristianismo mas qualquer religião é reflexo da mentalidade da época em que foi inventada. Quem não tem medo de raciocinar reconhece que os deuses dos livros sagrados das religiões foram criados pelo ser humano à sua imagem e semelhança. O cristão fundamentalista que se orgulha de seguir a Bíblia à risca, mas não obedece a cada um dos 613 mandamentos do Pentateuco e os 1.050 do Novo Testamento, engana-se a si mesmo e vive em incoerência.

Literalistas bíblicos usam passagens como Levítico 20:13 — “Se um homem se deitar com outro homem como quem se deita com uma mulher” — para condenar a homossexualidade, mas delas ignoram a ordem de Deus para matar homossexuais. Disso resulta que pastores e fiéis que, por ser abominada pelo deus da Bíblia, combatem a homossexualidade são hipócritas, pois têm a primeira parte do versículo como vigente, mas a segunda — “Terão que ser executados” — como caducada. Ao contrário da Bíblia, nenhum versículo do Alcorão ordena o assassinato de homossexuais. O que tende a acontecer quando fundamentalismo religioso é endossado a nível constitucional? As liberdades de consciência e religião acabam.

O Brasil nunca foi um país verdadeiramente laico, mas a infiltração e influência do Evangelicalismo na política tomaram proporções alarmantes. Jair Bolsonaro vociferou: “Deus acima de tudo. Não tem essa historinha de Estado laico, não. O Estado é cristão, e a minoria que for contra que se mude. As minorias têm de se curvar para as maiorias”. Foi precisamente o discurso talibã de Bolsonaro que o catapultou de ser um dos deputados mais medíocres, com só dois desimportantes projetos aprovados em 26 anos, a ser visto por evangélicos e católicos fanáticos como enviado de Deus para salvar o Brasil. Em 2018 mais de 70% dos evangélicos escolheram o candidato machista, homofóbico, pró-armas, pró-ditadura e pró-tortura, elegendo-o presidente.

O literalismo foi introduzido no século XVI por Martinho Lutero, o Pai da Reforma Protestante, o mesmo que em tudo via o Diabo e pregava o extermínio de bruxas, o espancamento de camponeses até à morte, o assassínio de anabatistas e a queima de sinagogas.

Expressa o Dr. Kevin Lewis: O literalismo ensinou a “letra” a expulsar o “espírito” dos escritos bíblicos, efetivamente abusando do texto, a fim de promover uma agenda teológica corrupta.

Seguir a Bíblia à risca não só é impossível como também loucura e literalismo é o fundamento do extremismo religioso.

Por que gostamos tanto de viajar? Não é porque às vezes nos cansamos de ver e sentir as mesmas coisas? Quem sabe porque o diverso nos fascina e estimula, o incomum nos desafia e educa? Lembra do filme Highlander, o Guerreiro Imortal, com Sean Connery e Christopher Lambert? Recorda-se também do slogan dessa película: “Só pode haver um”? Pois esse é o lema não oficial de muitas religiões e de todas as denominações cristãs. Toda igreja é, portanto, estabelecida sobre a presunção de ser a verdadeira representante de Deus na Terra.

Imaginemos que, após muitas décadas de enérgico trabalho missionário, uma igreja alcançasse seu tão almejado objetivo de convencer o mundo inteiro de que é a verdadeira. Imaginemos quase oito bilhões de pessoas ouvindo as mesmas mensagens, lendo os mesmos livros e cantando e escutando as mesmas músicas. Imaginemos todas as facetas das culturas dos diferentes povos, desde suas maneiras peculiares de pensar até suas artes, costumes, tradições, festas, comidas, indumentária e gostos, sendo infiltradas, alteradas e moldadas pelo modo de pensar, ser e viver que inevitavelmente é exportado junto com as religiões, se todas as pessoas passassem a professar uma única religião, não faria a menor diferença que ditasse, entre outras coisas, o que tem de ser ensinado nas escolas, pois ninguém haveria que achasse isso um despautério. Imaginar o mundo assim me dá calafrios. É como assistir a um filme de ficção científica de terror do tipo Os Invasores de Corpos.

O Cristianismo é tão perverso que põe em seus adeptos sentimento de culpa até por não o difundirem.

A pergunta que quase nenhum crente se faz é: “Mas que diabos é um ateu?”. Ateus não acreditam na existência de deuses, e por um motivo muito simples: falta de evidências. As “evidências” apresentadas por crentes não são livres de erros de raciocínio. Pelo contrário: são cheias de contradições.

Assim como não é possível provar a existência de seres sobrenaturais não é possível provar sua inexistência. Tecnicamente todo ateu é agnóstico. Mas só tecnicamente. Da mesma maneira que a probabilidade de que o Saci Pererê exista é tão minúscula a ponto de beirar zero, assim é para o ateu a de que Deus exista.

Numa escala de 1 a 10, em que 1 representa a certeza de que Deus existe e 10 a de que não existe, ateus convictos se encontram na posição de número 9. Cristãos e muçulmanos têm plena convicção de que demônios existem. Com que base racional poderiam, pois, contestar a existência, por exemplo, de vampiros?

Se existe uma expressão com que religiosos gostam de rotular ateus, é “pessoas vazias”. “Pessoa vazia” é também uma expressão figurada usada para caracterizar alguém de frívolo, vão ou fútil, cuja vida é inútil, sem valor ou sentido. Ora, a noção do que seja o sentido da vida só pode ser individual. Hitler, por exemplo, pode ter achado que nenhuma vida teve mais sentido que a dele. Digamos que ao taxá-los de vazios o crente na verdade esteja querendo dizer que ateus são pessoas infelizes. Quem afirma isso nunca se fez estas duas perguntinhas: Todo crente em Deus é feliz? Todo ateu é infeliz? se duvidar da existência de Deus torna alguém vazio, ou infeliz, todos os cristãos deveriam ser sempre plenos, ou felizes. Crer em Deus jamais poderá trazer plenitude, já que plenitude é um estado permanente de ausência de vazio, algo inalcançável. Cristãos nunca estão livres do sentimento de vazio que dizem ser exclusivo dos ateus. A propósito, se cristãos são plenos e ateus vazios, o que são crentes em Vishnu, Osíris, Zeus, Alá, Odin, Thor e Nhanderuvuçu? E o que dizer duma pessoa que inventa seu próprio deus? A convicção de que eu pertencia à igreja verdadeira não fazia de mim um cristão melhor que os membros das igrejas falsas.

É verdade que religiões podem servir de impulso para libertar pessoas do álcool e drogas, mas quando se trata de distúrbios emocionais crenças podem agravá-los, uma vez que é da natureza delas induzir os fiéis a confiar mais no auxílio divino que no dos homens.

Seguir uma religião é viver em paradoxo. Jesus disse a seus discípulos que o veriam voltar “com poder e grande glória” antes de morrerem. Como cristãos não podem admitir que a Bíblia contém erros, muito menos que da boca de Jesus tenham saído disparates, não têm outra saída senão debater-se com as palavras de seu Mestre, tentando decifrar o que quis dizer, para o que há diversas interpretações.

Se a Terra está prestes a ser destruída por Deus, por que haveriam os cristãos de se importar com a poluição? Crentes correm atrás do sucesso material da mesma maneira que não crentes, como se o mundo jamais fosse acabar. Nunca conheci um cristão que tivesse seguido o conselho de seu Mestre de vender todos os seus bens e dar o dinheiro aos pobres como também as igrejas que mais crescem são justamente as que prometem vida abastada, e isso apesar de tudo que Jesus disse contra o acúmulo de bens materiais e da admoestação do apóstolo Paulo de que “o amor do dinheiro é a raiz de toda espécie de males”.

Como, então, poderia haver compatibilidade entre política e uma crença religiosa cujos seguidores nem sequer se consideram cidadãos deste mundo?

Não é segredo que “guerra limpa” é uma ilusão e todo combate armado causa a morte de milhares de pessoas inocentes, muitas das quais crianças.

Quem, em sã consciência, seria besta de querer ser uma besta?

O caro leitor conhece um único cristão que não faz o oposto do que a Bíblia ensina e Jesus ordena?

Ora, haveria o ouro de ter algum valor para o ser que criou trilhões de galáxias?

Numa cidade em que todas as casas fossem de ouro, ele teria o mesmo valor dum tijolo. Se mansões de ouro não são prova de que o deus bíblico é fantasia, então não sei o que são.

O que políticos cristãos fundamentalistas realmente gostam de fazer é oposição. Em geral, opõem-se a laicidade do Estado, programas sociais, igualdade de gênero e raça e direito a aborto, eutanásia e casamento homossexual. Não obstante se verem como embaixadores da moral mais da metade dos representantes políticos da população evangélica brasileira têm pendências na Justiça. Mais de um terço dos deputados federais cristãos brasileiros “respondem a processo no Supremo Tribunal Federal.

Imagine, caro leitor, que você fosse não só a pessoa mais maldosa do mundo mas também a mais inteligente. Espalham por aí que, num futuro próximo, você agirá motivado por desespero, sofrerá uma humilhação de proporções cósmicas e será castigado pelos séculos dos séculos. Estaria você disposto a corresponder a suas expectativas, ou não lhe daria imensa vontade de frustrar suas previsões, fazendo exatamente o oposto do que dizem que você fará? Satanás conhece as profecias bíblicas, por que haveria de querer agir em conformidade com elas, fazendo-as se cumprirem?

Sem o dogma do livre-arbítrio, o Cristianismo não poderia existir, pois Lúcifer não teria como ter escolhido se rebelar contra Deus. Essa é uma das maiores contradições da crença cristã. Pensam que com o vocábulo “Deus” elucidam a origem do Universo, acham que com o termo “livre-arbítrio” explicam a origem do pecado. Livre-arbítrio não explica como um ser perfeito pôde ter o impulso de sentir, pensar e agir de maneira imperfeita.

Cristãos creem que no Céu, ou Paraíso, viverão infinitos centilhões de anos sem nunca pecar, é evidente que a eterna ausência de pecado só pode ser garantida se o Criador reprogramar suas criaturas para nunca mais fazerem o mal.

Satanás é um personagem muito contraditório. Por um lado, é a criatura mais inteligente do Cosmos, mas por outro um incrível paspalhão. Guerrear alguém que não tem como ser vencido é fazer papel de perfeito idiota cósmico. Ele poderia, por exemplo, cometer suicídio. O Porco-Sujo é um ser espiritual e não tem como morrer, está obrigado a viver para sempre? Se alguém não pode escolher não viver, onde está o livre-arbítrio? Ora, se seres espirituais não podem morrer, aparentemente a razão por que o Sarnento não comete suicídio, como poderão os demônios ser destruídos? Se não interagem com a matéria, como poderá o fogo do Inferno queimá-los?

Sempre que Jesus queria botar medo em seus ouvintes, mencionava o lago de fogo e enxofre. Tentemos imaginar um lugar em que pessoas são afligidas, agoniadas, atenazadas, atormentadas, castigadas, flageladas, mortificadas, penalizadas, punidas, queimadas, supliciadas e torturadas por muito tempo. Bilhões de pessoas chorando e rangendo os dentes numa colossal fornalha por infinitilhões de anos. O Inferno é o dogma mais estúpido do Cristianismo e Islã e que melhor evidencia o caráter perverso dessas religiões. O Inferno é irracional já por sua atroz desproporcionalidade. Apesar de viverem em média 65 anos, os seres humanos são torturados por toda a eternidade. (Só um punhado prega que o Inferno não é eterno.)

Mas não se descabele: você pode ser salvo. Basta admitir ser um pecador indigno, necessitado de salvação, e aceitar Jesus como seu salvador. Imagine um homem que é tão malvado, mas tão malvado, que quando olha para as flores elas murcham. Nos últimos segundos de vida o facínora se arrepende de todos os seus pecados e “invoca o nome do Senhor”. Por outro lado, um cardiologista que se consagra a salvar a vida de pacientes pobres e, por promover o diálogo entre as nações, vai para o inferno simplesmente por não ter crido em ser invisível algum.

Como os habitantes do Paraíso serão capazes de gozar a vida eterna sabendo que bilhões de seres humanos estão sendo “atormentados dia e noite, para todo o sempre”? terá Deus reprogramado os salvos não só para nunca mais pecar mas também para não pensar em seus familiares perdidos?

No filme Desconstruindo Harry, de 1997, Harry Block, o Inferno é dividido em níveis. Enquanto o elevador desce, uma voz feminina anuncia: Quinto andar: assaltantes de metrô, mendigos agressivos e críticos literários. Sexto andar: extremistas de direita, assassinos em série e advogados que aparecem na televisão. Sétimo andar: mídia. Desculpem, este andar está lotado. Oitavo andar: criminosos de guerra foragidos, televangelistas e Associação Nacional de Rifles. Último andar: desçam todos.

Por que tanta gente continua crendo nesses mitos mesmo depois de atingir a maturidade? Se há só 250 anos era comum acreditar em bruxas e vampiros, o que dizer da cosmovisão da época em que esses livros milenares foram escritos? “Você conhecerá o antídoto para não se contaminar com uma das piores doenças do mundo moderno, o consumismo”. Quem quiser ser curado do consumismo tem de consumir, quer dizer, comprar esse livreto.

Religiosos gostam de afirmar que crer em Deus é natural, pois o Criador implantou em suas criaturas o instinto de nele crer. Se isso fosse verdade, haveria necessidade de oferecer Deus de porta em porta e em programas de rádio e televisão? Não haveriam todas as pessoas de crer, sobretudo no mesmo deus?

Em muitas religiões, humildade é uma doutrina tão fundamental quanto amor e perdão. Paradoxalmente, porém, religiões não fazem as pessoas serem humildes. As incontáveis guerras religiosas ao longo da História são prova disso. É impossível a ideia de verdade absoluta de validade universal, revelada a um povo escolhido a dedo por ninguém menos que o Criador do Universo, não gerar arrogância.

Falsas certezas são possíveis só quando o pensamento crítico foi suprimido e o questionamento deixou de existir, a proibição da carne de porco, obedecida por judeus ortodoxos e alguns cristãos, também pelo Alcorão. Todavia, não obstante vir sendo consumida há milênios, não há indícios alguns de que cause malefícios a ponto de precisar ser declarada perigosa, a não ser que se bata na cabeça de alguém com um pernil. Ninguém, nem mesmo judeus ortodoxos, sabe explicar o motivo de Yahweh ter proibido o consumo da carne suína.

Além de inútil, essa lei causou a morte de muitas pessoas. A carne suína é um bom exemplo de incoerência bíblica e cristã. A grande maioria dos cristãos come porco, contudo, por fazer parte da Escritura, “toda inspirada por Deus”, começa com um claro “Disse o Senhor”. Se Yahweh-Jesus declarou que o porco é imundo, razão por que proibiu seu consumo, como poderia esse animal ter deixado de ser imundo?

Várias das leis bíblicas relacionadas a limpeza pouco ou nada têm a ver com higiene.

O Criador do Universo se deu ao trabalho de criar leis sobre como proceder com pessoas com doenças de pele, como a lepra, mas, por mais incrível que possa parecer, não ao de passar à Humanidade informações que teriam salvo a vida de milhões de pessoas, como sobre bactérias e vírus e como curar as enfermidades que eles causam. Limitou-se a ordenar que leprosos fossem banidos do arraial para, entregues à sua própria sorte, ou melhor, azar, morrerem solitários. Se isso não é prova de como a religião judaico-cristã é primitiva, então não sei o que é.

“Por seus frutos os conhecereis” vale só para os seres humanos, nunca para Deus. Deus escreveu: “Eu, o Senhor, o teu Deus, sou Deus zeloso, que castigo os filhos pelos pecados de seus pais até a terceira e quarta geração” (Êxodo 20:5). Tempos depois se esqueceu do que escrevera e se contradisse: “Ele não morrerá por causa da iniquidade do seu pai […]. Aquele que pecar é que morrerá. O filho não levará a culpa do pai, nem o pai levará a culpa do filho” (Ezequiel 18:17,20). “Quem nasceu de união ilícita não poderá entrar na assembleia do Senhor, como também os seus descendentes, até a décima geração” (Deuteronômio 23:2).

Desnecessário dizer que hipocrisia não é algo que se encontra apenas no meio religioso. Somos todos suscetíveis de ser hipócritas. Sem embargo, entre crentes a hipocrisia superabunda, e isso por culpa da própria crença. Há algo de não natural na religiosidade judaico-cristã que invariavelmente gera hipocrisia. Nisso não haveria problema algum, se crentes guardassem sua crença para si. Quem está acostumado à extrema violência dos relatos bíblicos, que ele aceita como verídicos, acha a violência hollywoodiana de Rambo II até divertida. Para muitos jovens cristãos, é emocionalmente desgastante viver nesse dualismo. De um lado, a religião determinando tudo que devem considerar mau; do outro, a natureza humana naturalmente querendo desfrutar a vida sem sentimento de culpa.

Acho improvável haver uma religião que não imponha culpa, mas quase impossível haver uma que em imposição de culpa ganhe do Cristianismo. Todos nós acreditamos na cobra falante e mordemos a fruta proibida. Todos os seres humanos são culpados da morte de Jesus. Até o querer ser deixado em paz é merecedor de castigo. Precisamos ter medo só de ter tido o azar de não descobrir qual das 40.000 denominações cristãs é a verdadeira. Nenhum cristão está livre de ser surpreendido no Juízo Final com a devastadora informação de que foi cristão em vão, pois fez parte da igreja falsa. Qualquer crença pode ser a certa e todas podem estar erradas.

Como poderia Deus ser justo ao exigir de suas criaturas que acreditem em coisas que lhes parecem absurdas? Se divergir de dogmas religiosos é divergir de Deus, e divergir de Deus é passível de punição, então ele realmente criou não pessoas livres, mas robozinhos, e robozinhos que não pensam da maneira como foram programados para pensar estão avariados.

ALGUMAS DÉCADAS NO futuro a Ciência acaba de descobrir que Deus realmente existe. Bilhões de crentes quase explodem de euforia. Uma notícia complementar: a Ciência descobriu que Deus não ouve orações e vida após a morte não existe. Silêncio abrupto. Da euforia à depressão profunda, num segundo. Uma hora mais tarde os crentes começam a dizer que essa pesquisa científica é furada. Coisa dos Illuminati. Quem haveria de querer adorar um deus assim?

Religiões se resumem em duas coisas: recompensa e castigo. Vantagem pessoal é, portanto, o que motiva muita gente a seguir uma religião. Vida eterna, Paraíso, proteção, cura e prosperidade são produtos vendidos pelas religiões, e em nenhuma são comercializados com tanto sucesso quanto na cristã.

Concedendo que Deus protege suas criaturas, as desgraças que acometem crentes demonstram que eles não são mais protegidos que não crentes, do que resulta que as intervenções divinas não têm como ser atestadas. Quando um avião cai, às vezes vemos na TV alguns passageiros agradecerem a Deus por terem chegado tarde e perdido o voo. Crer no deus bíblico não torna pessoa alguma imune sequer a simples resfriados.

Não passa pela cabeça dos crentes que se Deus atende às orações de alguns e os protege ou cura, é um deus injusto. Se eu tivesse câncer, fosse curado e atribuísse a cura a Deus, como poderia eu ser-lhe agradecido sabendo que, todo ano, ele deixa dez milhões de pessoas, incluindo crianças, primeiro sofrerem por meses, depois morrerem dessa doença?

Se fosse verdade que a oração salva o doente, como diz a Bíblia, cristãos não teriam necessidade alguma de médicos, medicamentos e hospitais. Nunca e para mal algum. É teologia da própria Bíblia que nada pode acontecer sem Deus permitir. Por que, então, haveria de curar pessoas das doenças que permitiu? Quem acredita que Deus cura acredita num deus sádico.

Religião derivada do Judaísmo e Cristianismo, o Islã é tão irracional (e perverso) quanto eles. A Kutub al-Sittah, uma compilação de ditos e atos de Maomé, conta que o profeta disse: “Alá enviou tanto a doença quanto a cura, e designou uma cura para cada doença”. Deus é como um médico ou farmacêutico que cria enfermidades para ser louvado por curá-las.

Por que não vemos cristãos colarem de volta membros decepados? apesar de Cristo ter dito que quem nele crê pode fazer obras maiores que as que ele fez?

Deus sabe o que um devoto lhe implorará daqui a cinquenta anos. Mais ainda, Deus sabe que resposta dará antes mesmo de o crente nascer. Existe profissão mais tediosa que ser Deus?

Um ser perfeito não sente falta de coisa alguma, e um ser que existe desde sempre não tem motivo para criar o que quer que seja. Se, em razão de seus atributos, o deus judaico-cristão-muçulmano não pode ser limitado por coisa alguma, nem mesmo pelo tempo, para ele o futuro não existe. Tudo acontece agora, no presente. Logo, Deus não ouve preces, pois como haveria de fazer acontecer ou não acontecer o que para ele já está acontecendo? Em consequência disso, o livre-arbítrio, um dogma tão essencial para a fé cristã, não passa de ilusão.

Um ser que não pode ser limitado pelo tempo não pode existir num sistema limitado pelo tempo. O Universo é limitado pelo tempo! Não podendo ser atemporal e temporal ao mesmo tempo, Deus não tem como existir no Universo.

Se pedem e recebem, crentes dizem: “Deus atendeu à minha súplica”. Se não recebem, dizem: “Deus sabe o que faz”. Sempre é feita a vontade de Deus. Orar é tão ridículo quanto inútil.

Haveria um cristão que precisa dum automóvel, mas não tem dinheiro para comprar um, de pedi-lo a Deus? Muito improvável. Agora, se orar dizendo: “Ajuda-me, ó Pai, a ganhar dinheiro para comprar um carro”, e trabalhar duro, economizando ao máximo, é possível que alcance seu objetivo.

O que pedem crentes em oração? Proteção, saúde, sabedoria e paz. Afinal, que outras coisas haveriam de pedir? “Extingue, ó Deus, todos os vulcões”? “Acaba, ó Senhor, com os terremotos”? “Não permitas, ó Pai, que buracos negros devorem estrelas”? Vez ou outra, pedem algo um pouco mais específico, como ajuda para passar numa prova. Entretanto, estudam, pois sabem que Deus não lhes sussurrará as respostas.

As discrepâncias entre o que está escrito em livros sagrados, e é pregado e cantado em templos, e a realidade são gritantes. Mesmo assim, bilhões de pessoas insistem em acreditar em seres invisíveis. O Estudo Global Sobre Homicídios, realizado em 2019 revela que o continente americano é a região mais violenta do mundo. É precisamente onde se encontram os países com a maior concentração de cristãos.

Em 2020, o Global Business Policy Institute, de Nova Iorque, perguntou a 370.000 pessoas em 148 países se se sentem religiosas. Mais de 98% dos habitantes da Somália, Níger, Bangladesh, Etiópia, Iêmen, Malawi, Indonésia, Sri Lanka, Mauritânia e Djibouti responderam “Sim”. Oito desses países estão entre os menos desenvolvidos. Eis a questão: São tão subdesenvolvidos porque são tão religiosos ou são tão religiosos porque são tão subdesenvolvidos? As duas opções deixam a religião em maus lençóis.

No Corruption Perceptions Index de 2019, da Transparency International, os 20 menos corruptos são todos países em que a maior parte dos cidadãos dá à religião nenhuma importância. Quem argumentar que toda essa corrupção, violência e pobreza dos países mais religiosos nada tem a ver com religião terá de explicar por que ela não evita toda essa corrupção, violência e pobreza. Quem afirmar que, em face de tanta religiosidade, o mundo não é melhor porque a maioria dos religiosos não faz o que Deus quer estará admitindo que religião não serve para coisa alguma.

Consideremos temas como guerras, escravidão, liberdade de consciência, igualdades racial, de gênero e de justiça, justiça social, saúde e educação. Seria coincidência que antes da Idade da Razão, quando o mundo era dominado pelo pensamento religioso, nessas áreas não foi feito progresso algum, mas depois dela, com a crescente secularização das sociedades, foi?

Se religião é sinônimo de moralidade; secularismo, de decadência, não deveríamos esperar mais justiça das sociedades mais religiosas e ver mais injustiça nas mais seculares? Visto ser o inverso, é natural indagar se religiões impedem o desenvolvimento da Humanidade.

A Igreja Católica manteve relações amigáveis com a Alemanha nazista, expulsou muitos comunistas, como Fidel Castro, mas Hitler ela não excomungou. Cristãos precisam se perguntar por que, apesar de cristã, a esmagadora maioria da população alemã e austríaca não só não se opôs ao regime racista de Hitler como até de todo o coração o apoiou.

É fato histórico que a Igreja Católica nunca fez oposição a regimes fascistas e ditatoriais. Após a ocupação nazifascista da Iugoslávia, Hitler e Mussolini instalaram o católico Ante Pavelić, fundador e líder da organização ultranacionalista e terrorista Ustaše, como líder do Estado Independente da Croácia. Estima-se que cerca de 400.000 sérvios foram assassinados durante a curta existência do Estado Independente da Croácia. Em 8 de maio de 1945, dia da capitulação da Alemanha nazista, Ante Pavelić escapou para a Áustria. Disfarçado de padre, o ditador católico fugiu para a Itália, mais especificamente para o Vaticano, que lhe deu abrigo e proteção por mais de dois anos. Em novembro de 1948, foi viver na Argentina. Em 1957, o ditador católico Francisco Franco lhe concedeu asilo na Espanha, onde Pavelić viveu pacificamente até morrer com 70 anos. Não é segredo que a Ustaše saqueou os bens e confiscou as propriedades das pessoas que eliminou. Há fortes indícios de que essa riqueza foi convertida em ouro e depositada no Banco do Vaticano. Em 1999, sobreviventes e parentes das vítimas do Holocausto Croata entraram com uma ação judicial coletiva nos Estados Unidos contra o Istituto per le Opere di Religione, vulgo Banco do Vaticano, e a Ordem dos Franciscanos, reivindicando compensação. Um tribunal de apelação acabou arquivando o processo, reconhecendo imunidade ao banco da Igreja Católica. Todos os conflitos abrem feridas, mas as abertas pelos de fundo religioso quase nunca cicatrizam.

Estas pessoas têm pelo menos duas coisas em comum: Adolf Hitler, católico; Alberto Fujimori, católico; Alejandro Agustín Lanusse, católico; Anastasio Somoza Debayle, católico; Anastasio Somoza García, católico; Ante Pavelić, católico; António de Oliveira Salazar, católico; Augusto Pinochet, católico; Chiang Kai-shek, metodista; Daniel arap Moi, cristão; Ferdinand Marcos, católico; Francisco Franco, católico; François Duvalier, católico; Fulgencio Batista, católico; Gabriel París Gordillo, católico; Georgios Papadopoulos, ortodoxo grego; Getúlio Vargas, católico; Gustavo Rojas Pinilla, católico; Humberto de Alencar Castelo Branco, católico; Ioannis Metaxas, ortodoxo grego; Ion Antonescu, ortodoxo romeno; Jean-Claude Duvalier, católico; Jerry Rawlings, católico; Jorge Rafael Videla, católico; Jozef Tiso, católico; Juan Carlos Onganía, católico; Juvénal Habyarimana, católico; Leopoldo Galtieri, católico; Miklós Horthy, calvinista; Mobutu Sese Seko, católico; Rafael Leónidas Trujillo, católico; Reynaldo Bignone, católico; Robert Mugabe, católico; Roberto Eduardo Viola, católico; Teodoro Obiang Nguema Mbasogo, católico; Vladimir Putin, ortodoxo russo; Yakubu Gowon, cristão; Yoweri Museveni, anglicano. Esse é um rol de ditadores e governantes autoritários (ou corruptos, ou opressores, ou genocidas) unidos também por uma coisinha chamada religião. Todos adoradores de Jesus.

Arábia Saudita, uma teocracia em que blasfemar, mudar de religião ou querer viver sem ela é punido com a morte (qualquer semelhança com as leis bíblicas não é mera coincidência).

O presbiteriano Ronald Reagan, sucessor do batista Jimmy Carter, enviou especialistas da Agência Central de Inteligência a vários países das Américas Central e do Sul para dar aulas de tortura a suas polícias. Religião e autoritarismo não são incompatíveis porque estão baseados nos mesmos princípios.

Onde se exige submissão, não se tolera divergência. Com efeito, o deus da Bíblia severamente castigava divergentes, e Jesus, a versão mansinha de Yahweh, prometeu torturar no Inferno quem lhe dá as costas.

A palavra mágica é secularismo. Se não fosse o Século das Luzes, ainda estaríamos vivendo em teocracias e divergentes estariam sendo torturados e queimados. A laicização das sociedades possibilitou a criação de leis proibindo a execução de ordens bíblicas hediondas, como para assassinar descrentes e praticantes de credos diferentes.

A fim de poderem existir, religiões precisam de liberdade religiosa, que paradoxalmente vem justamente daquilo que mais combatem: a secularidade. Só em regimes laicos e democráticos pode haver tolerância. Por que divergentes são executados nas teocracias islâmicas? Porque em teocracias não há liberdade de consciência.

O Velho Testamento não é outra coisa senão a história duma teocracia cujo povo, a mando dos representantes de Deus, exterminou povos com religiões diferentes e era constante e severamente castigado por duvidar ou se voltar para outros deuses. Yahweh nunca concedeu a Israel direitos tão básicos como estes: Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento, consciência e religião; este direito inclui a liberdade de mudar de religião ou crença […]. Toda pessoa tem direito à liberdade de opinião e expressão […]. Ninguém poderá ser obrigado a fazer parte de uma associação. (Artigos 18, 19 e 20 da Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Se o Céu existir, não quero ir para lá, pois não quero viver numa teocracia.

Se você não desassocia as ações dum Stalin do Ateísmo dele, por que separa as ações dum Pinochet do Teísmo dele? Se déspotas cristãos não são bons exemplos de Cristianismo, déspotas ateus não são bons exemplos de Ateísmo.

Matar em nome do Ateísmo é simplesmente impossível. Ateísmo não é um conjunto de doutrinas ou princípios. Ateísmo é descrença da existência de divindades. Descrença — e nada mais. Exatamente como a descrença da existência do Saci Pererê, a descrença da existência de deuses nada ensina, e o que nada ensina a nada motiva. As desumanidades cometidas por Stalin, Mao Tsé-Tung e Pol Pot não têm, portanto, como terem sido motivadas pelo Ateísmo. Religiões, sim, são conjuntos de doutrinas e princípios e códigos de ética que moldam pensamentos e estimulam a agir. Dogmas religiosos, sim, podem gerar fanatismo e produzir intolerância.

É inegável que o deus das religiões judaico-cristã e muçulmana manda matar. Está escrito na Bíblia e no Alcorão para qualquer criança ler.

Um dia, alguém inventou Yahweh, conhecido também como Alá, o deus da Bíblia e do Alcorão.

Regimes de ditadores ateus têm muito em comum com religião. Em 2007, o jornalista e escritor Christopher Hitchens disse: Stalin diz que o tempo todo se deve dar graças ao líder e o tempo todo ele deve ser louvado por sua gentileza e bondade. Aliás, ele sempre manteve a Igreja Ortodoxa Russa a seu lado. Ela permaneceu parte do regime. Outra grande figura do eixo do mal daquela época, o imperador do Japão, não foi apenas uma pessoa religiosa, mas de fato um deus. Então, Fascismo, Comunismo, Estalinismo e Nazismo não são, na verdade, nada seculares, como algumas pessoas pensam, e são muito mais religiosos que a maioria das pessoas pode imaginar. Estive na Coreia do Norte. Posso lhes dizer que a Coreia do Norte é o Estado mais religioso em que já estive. Quando criança, eu costumava me perguntar como seria louvar Deus e agradecer-lhe dia e noite. Bem, agora o sei, pois a Coreia do Norte é um Estado completamente adorável. Está configurado só para isso, para a adoração. E falta só um para uma Trindade. Têm um Pai e um Filho, como vocês sabem, o Querido Líder e o Grande Líder. O Pai ainda é o presidente do país. Está morto há quinze anos, mas Kim Jong-il, o pequeno, é apenas o chefe do Partido e do Exército. Seu pai ainda é o presidente, o chefe de Estado. Um, só um, falta para uma Trindade*: Devo adicionar que eles não ameaçam seguir você depois de sua morte. Você pode deixar a Coreia do Norte. Você pode sair do Inferno e Paraíso deles morrendo. Do cristão e do muçulmano, você não pode. [* Em 2011, Kim Jong-un, neto do fundador da Coreia do Norte, tornou-se Líder Supremo, assim criando a Trindade]



Associar Socialismo e Comunismo a Ateísmo é outra grande simploriedade típica de religiosos. Há cristãos que defendem que Jesus foi o originador do Comunismo. Dois dos temas mais centrais dos ensinamentos do Nazareno são a vida simples, despojada de riquezas materiais, e a solidariedade, tanto assim que foi exatamente dessa maneira que seus seguidores passaram a viver. Os que criam mantinham-se unidos e tinham tudo em comum. Vendendo suas propriedades e bens, distribuíam a cada um conforme a sua necessidade. (Atos 2:44-45)

Da multidão dos que creram, uma era a mente e um o coração. Ninguém considerava unicamente sua coisa alguma que possuísse, mas compartilhavam tudo o que tinham. […] Não havia pessoas necessitadas entre eles, pois os que possuíam terras ou casas as vendiam, traziam o dinheiro da venda e o colocavam aos pés dos apóstolos, que o distribuíam segundo a necessidade de cada um. (Atos 4:32,34-35)

Não é incrível que o Criador do Universo não tenha sido capaz de revelar sua vontade dum modo que não pudesse ser deturpada? Daniel Edwin Barker pergunta: “Paulo escreveu que ‘Deus não é Deus de confusão’, mas você consegue pensar num livro que tenha causado mais confusão que a Bíblia?”.

A concepção de que não brancos são raças amaldiçoadas por Deus tem longa tradição no Cristianismo. A tal maldição de Cam foi repetidamente usada por cristãos como justificativa para a escravidão sobretudo de negros, mas também de índios. “Não há lei divina que proíba a possessão de escravos”, diz o padre, que também possuía alguns, pois em lugar algum as Sagradas Escrituras reprovam a escravidão. Muito pelo contrário.

A Bíblia em lugar algum faz alusão alguma a negros serem pessoas malditas e, por conseguinte, inferiores. Como se isso não bastasse, a justificativa para a supremacia branca se baseia na ingênua pressuposição de que esse relato é fato histórico, e não uma lenda. E ainda que fosse histórico, a maldição não foi proferida por Deus, mas por Noé. Some-se a isso a pergunta: Que deus é esse que traz sofrimento sobre tantas gerações de pessoas inocentes?

Cristãos que acreditam que moralidade se aprende na Bíblia ou não a leem com atenção ou ignoram tudo que lhes causa desconforto e embaraço. Teriam os europeus cometido tantas barbaridades, se o Livro dos Livros ensinasse que invadir nações e escravizar ou exterminar seus povos é imoral?

O que na Bíblia há de moral não justifica o que nela há de imoral. É com fúria que muitos cristãos combatem o direito da mulher ao aborto, apesar de essa moral ter sido inventada por um deus que faz uso de feticídio para castigar quem lhe dá as costas: O povo de Samaria carregará sua culpa, porque se rebelou contra o seu Deus. Eles serão mortos à espada; seus pequeninos serão pisados e despedaçados, suas mulheres grávidas terão rasgados os seus ventres. (Oseias 13:16)

Voltemos a imaginar que acredito que o Sol é Deus. Ele se revelou a mim. O Sol me pediu para pregar que a vida é um presente de amor incondicional. Ele nada espera em troca. Nadica de nada. Zero. O Sol não recompensa ou castiga pessoa alguma. Ele me pediu para advertir as pessoas de que Paraíso e Inferno existem. Nós mesmos os criamos. O Paraíso é o resultado automático de não fazermos mal a pessoa alguma e sermos solidários. Agir contrário a esse princípio resulta em Inferno. Tudo que o Sol quer é que vivamos a vida da melhor maneira possível, pois é a única que temos. Pronto. Acabei de criar uma religião muitíssimo melhor que todas as de que já ouvi falar. Por não segui-la, ninguém é nem discriminado, nem escravizado, nem perseguido, nem torturado e nem morto, pois, ao contrário do deus da Bíblia, Alcorão e outros, o deus da minha religião abomina essas coisas. E como se isso já não fosse suficiente para adorar o Sol, ainda por cima não precisa de dinheiro. Não é divino? O que? O caro leitor gostou da minha religião, mas não da parte em que o Sol é Deus? Hmmm… No problem. Tire o Sol e siga o resto.

Razão “Será que tem o Senhor, para abrandar o sofrer, alguém a quem implorar ou temer? Porque se Deus não tem Deus, como é que pode querer que eu seja crente sendo ele um ateu?” — Celso Viáfora (Deus de Deus)

Religiões existem para os inconformados com a morte. Conjecturar sobre vida após a morte não é repreensível, nem vergonhoso. É apenas perda de tempo. “És poeira estelar e à poeira estelar tornarás”. Com a maior das naturalidades, crentes aceitam que houve um tempo em que eles não existiam, mas não aceitam que haverá um tempo em que eles não existirão.

Vida é vida. Não existem diferentes tipos de vida. Existem apenas diferentes tipos de seres vivos, além de irracional a concepção religiosa de vida eterna é arrogante, posto que antropocêntrica.

Em dezembro de 2014, no Texas, Lindsey Blansett matou seu filho Caleb, de dez anos, enquanto ele dormia. Em seguida, telefonou para a polícia dizendo que salvara o filho “da dor que estava por vir”. Esse hediondo crime é um excelente exemplo da absurda lógica cristã. Por ela, é inegável que essa mãe praticou uma boa ação, pois catapultou seu inocente filho ao Paraíso.

John Emil List, assassinou a família inteira: mãe, esposa e três filhos. A maior preocupação de List era a possibilidade de seus entes queridos irem para o Inferno, sobretudo por causa da ambição da filha de se tornar atriz. “Eu tinha medo quanto ao que isso poderia causar à vida cristã dela.” Se ela saísse da igreja, racionalizou List, isso poderia influenciar negativamente não só os irmãos mas também a mãe, que não estava muito firme na fé. A carta diz ainda: Pelo menos, estou certo de que todos foram para o Céu. Se as coisas tivessem continuado, quem garante que isso seria o caso? Questionado por que não se suicidou, o familicida respondeu que isso o teria impedido de ir para o Céu, onde esperava se reunir à sua família.

No dia em que escrevo estas linhas, os evangélicos Bruce e Deborah Leonard, espancaram e açoitaram seus dois filhos por não quererem ir ao culto. Um deles morreu. Deuteronômio 21:18-21 e 13:6-10, Yahweh-Jesus ordena o assassinato de filhos por rebeldia.

Em Números 31, Moisés, o homem com quem Yahweh “falava face a face, como quem fala com seu amigo”, manda os soldados israelitas invadirem uma nação e matarem todos os homens, mulheres e meninos, mas tomarem para si “todas as meninas virgens”. Nunca vi um cristão se indignar com essa bárbara perversidade. Ao invés de sentirem repulsa, encontram justificativas.

Nenhum cristão pode dizer que Bruce e Deborah são maus exemplos de cristãos. Queriam era impedir que sua prole seja jogada nas chamas do Inferno. Para tanto, fizeram precisamente o que o deus cristão manda. Os cristãos que acham que os membros da Word of Life Church cometeram um terrível pecado têm de parar de chamar a Bíblia de Palavra de Deus.

Se um dia foi moral apedrejar filhos rebeldes, visto que ordem divina, isso não pode ter se tornado imoral.

Isto é o que William Lane Craig ele pensa sobre as carnificinas ordenadas pelo deus judaico-cristão: Deus sabia que, se a essas crianças cananeias fosse permitido viver, seriam a ruína de Israel. Na verdade a morte dessas crianças foi sua salvação. Por isso, Deus não faz mal algum a essas crianças ao tirar suas vidas. Em outras palavras, passar crianças cananeias ao fio da espada foi um ato de amor divino.

Se essa ordem tivesse sido dada por um general da Segunda Guerra Mundial, cristãos acertadamente o chamariam de monstro genocida pedófilo.

Quando cristãos dizem “Ah, isso era costume da época”, estão admitindo e confirmando que sua religião nada tem de divino, mas é puro reflexo da mentalidade primitiva das pessoas que a conceberam. Yahweh era favorável a coisas que nos tempos bíblicos eram costume e, consequentemente, morais, como incesto, poligamia, genocídio, escravidão e apedrejamento de adúlteras e filhos rebeldes.

A cristandade inteira seleciona do livro que ela considera sagrado decidindo o que ainda é válido e praticável como não são literais, mas alegorias, apenas se deve procurar extrair lições. Ora, não é exatamente isso o que fazemos com qualquer obra literária?

Não há razões para a Bíblia gozar de posição privilegiada. Religião causa insensibilidade. Milhões de judeus festejam no Pessach uma liberação em que Yahweh matou, de acordo com estimavas, cerca de 1.000.000 de crianças egípcias. Assassinou milhões de inocentes pelo simples prazer de demonstrar seu poder destruidor: “O faraó não lhes dará ouvidos, a fim de que os meus prodígios se multipliquem no Egito” (Êxodo 11:9). A deidade é a mesma que não mexeu um dedo sequer para livrar milhões deles das mãos de Hitler.

O mau das religiões é serem capazes de levar seus seguidores a praticar maldades convictos de que estão obedecendo a ordens do Criador do Universo. Quando a resistência dos “nativos pagãos” era grande, os invasores achavam que Deus os estava punindo por seus pecados e falta de fé. Quando massacravam muitos índios os cristãos agradeciam a Deus.

Quando o assunto é guerra, o caro leitor já viu alguém se importar com a sorte dos equinos?

Umas mais que outras, mas todas as religiões são ditaduras do pensamento. Se uma igreja rotula, por exemplo, a Teoria Científica da Evolução de ensinamento satânico, seus membros a demonizarão, mesmo que lhes mostremos em seus próprios corpos as evidências de que é factual.

O Discovery Institute, uma organização cristã conservadora, de Seattle, publicou, em 2007, a declaração “Uma Dissensão Científica do Darwinismo”, endossada por cerca de 1.000 cientistas, só um quarto deles biólogos.
O National Center for Science Education, de Oakland, criou o “Projeto Steve”, que consiste duma lista de cientistas evolucionistas, mas só com o nome de Steve.
Em torno de 1.500 Steves assinaram a lista.

Cientistas que acreditam em Deus são uma minoria. Uma pequena parte acredita no deus bíblico, enquanto a maior é deísta, quer dizer, não acredita em deus específico algum. 97% defendem a Evolução.

De acordo com os literalistas bíblicos, “é necessário ter fé para acreditar no que a Ciência ensina”, razão por que “também é religião”. Isso é adorar dar tiro no próprio pé, pois é admitir que não se deve confiar no que tem de ser aceito pela fé, algo que a Ciência, por sinal, não requer, já que se baseia em evidências.

Dirá um cristão, “Pegue os filósofos. A maioria dos filósofos crê em Deus”. O estudo Em Que Creem os Filósofos? da University of Western Ontario e New York University, e publicado em 2013, revelou que 72,8% são ateus.

O ceticismo do meio acadêmico demonstra que inferir da Natureza a existência dum Criador não é assim tão natural quanto o apóstolo Paulo nos quer fazer crer. Na internet, contemple, caro leitor, a fotografia intitulada Hubble eXtreme Deep Field. Você esperaria da mente que criou esses trocentilhões de estrelas e planetas que escolhesse uma coletânea de cópias de cópias de mais cópias de farrapos de fragmentos de pergaminhos da Idade do Ferro como forma de se comunicar?

Não esperaria você que fosse direto, claro e preciso e contivesse informações realmente úteis e práticas? O senso de que se vive melhor quando se faz o bem, nem sequer provém do livro da capa preta, mas já era aplicada no Egito Antigo, como atesta a história d’O Camponês Eloquente, escrita uns 2.000 anos antes de Jesus nascer.

Se Jesus disse: “Observem as aves do céu”, eu digo: “Observem as aves do céu, mas também as galáxias”. Quando as contemplamos, sentimos como as concepções que religiões têm de Deus são infantis. Se existir, Deus não pode ser tão pequeno, caprichoso, sádico. Isso inclui gostar de ser bajulado.

Não se preocupem, dizendo: ‘Que vamos comer?’ ou ‘Que vamos beber?’ ou ‘Que vamos vestir?’ Pois os pagãos é que correm atrás dessas coisas” precisa de muita grana para alimentar e vestir seus pastores e manter seus templos.

Um ser sobrenatural se preocupa tremendamente com o que você faz com seu pênis ou vagina.

A Natureza equipou o ser humano com senso crítico, o mesmo que faz crentes sentirem que os seres e lugares invisíveis das religiões dos outros não existem.

É comum cristãos orarem dizendo “Senhor, aumenta minha fé”, o que evidencia a antinaturalidade da crença nas coisas que a Bíblia ensina. Se crentes não tivessem consciência de que acreditam em fantasias, não se enfureceriam diante de críticas à sua fé.

Ateus, que têm tanto medo do Inferno cristão quanto cristãos do Inferno muçulmano.

Não é necessário ser um gênio para saber que bem gera bem e mal gera mal, do que resulta que felicidade é possível só onde o bem predomina. Nada há de religioso nisso.

A ameaça de castigo eterno contraria o próprio dogma do livre-arbítrio. Que valor teria uma decisão que eu tomasse com alguém apontando uma arma para minha cabeça? O tal livre-arbítrio seria legítimo só se não houvesse ameaça de tortura e as pessoas tivessem não duas, mas três opções de escolha: viver eternamente com o deus bíblico, viver eternamente sem o deus bíblico e não viver.

Religião é a ilusão de ter respostas a indagações para as quais ninguém tem respostas.

Se religiões recentes não são menos bizarras, é porque são reinvenções de antigas.

Imaginemos que religiões nunca tivessem existido. Com o conhecimento que temos nos mais variados campos científicos, sobretudo Antropologia, Astronomia, Biologia, Física, Genética, Geologia, Medicina, Paleontologia, Química e Sociologia, qual a probabilidade de que surgissem religiões como Hinduísmo, Budismo, Judaísmo, Cristianismo e Islã?

“Seu amiguinho imaginário não existe e seu clubinho é falso. Meu amiguinho imaginário é que existe e meu clubinho é que é o verdadeiro!”

Se o Cristianismo e Islã fossem religiões boas, quanto mais à risca, isto é, fundamentalisticamente fossem praticados melhor seria para o mundo. Não é estranho que seja justamente o contrário: quanto mais à risca são praticados, pior? Isso se aplica a, provavelmente, qualquer religião, por mais inofensiva que possa parecer.

A cena de que mais gosto do filme Desconstruindo Harry, de Woody Allen, é aquela em que Harry discute com sua irmã Doris, uma judia devota:
— Na maioria das vezes, você ridicularizava minha dedicação religiosa, pois sempre o enfureceu eu ter retornado a minhas raízes.
— Que raízes? Você era uma criança maravilhosa, doce. Você me ajudou na infância. Depois, foi para Fort Lauderdale e encontrou esse fanático, esse zelote, e ele encheu você de superstição.
— É tradição.
— Tradição é a ilusão de permanência.
— Você não tem valores. Toda sua vida é niilismo, cinismo, sarcasmo e orgasmo.
— Na França, eu poderia concorrer com esse slogan e ganhar.
— Sou judia. Nasci judia. Você me odeia por causa disso?
— Se nossos pais tivessem se convertido ao Catolicismo um mês antes de você nascer, seríamos católicos. São clubes. São exclusivistas, todos eles. Estimulam a ideia do “outro” para que você saiba exatamente quem deve odiar.
— Basta!
— Deixe-me perguntar-lhe uma coisa: se um judeu é massacrado, isso a incomoda mais que se um não judeu é ferido, ou um negro ou um bósnio?
— Sim. Não posso evitá-lo, é meu povo.
— Todos eles são seu povo!

Não seria o mundo melhor, se nenhum grupo pensasse ter uma linha direta com Deus? Imaginemos um mundo em que, em vez de mutuamente se desprezarem por causa de convicções religiosas, as pessoas vivessem inspiradas pelas ideias de figuras como Bento de Espinosa, Voltaire, David Hume, Thomas Paine, Mary Wollstonecraft, Lydia Maria Child, John Stuart Mill, Etta Semple, Albert Einstein e Jiddu Krishnamurti. Quão provável é que os ensinamentos de mestras e mestres como esses induzam pessoas a discriminar outras, inferiorizar a mulher, mutilar os genitais de crianças, estuprar e matar por honra, guerrear, conquistar e escravizar outros povos, cometer genocídios, perseguir, torturar e perpetrar ataques terroristas?

Que motivação para verdadeiramente se importar com o mundo têm pessoas que esperam que ele seja destruído por Deus o mais cedo possível? Dados do Stockholm International Peace Research Institute mostram que todos os governos juntos gastam perto de dois trilhões de dólares com suas forças armadas. Todo santo ano. Quase o dobro do que gastam com pesquisa e desenvolvimento — e 6,6 vezes o que custaria erradicar a fome.

O caro leitor verá religiosos empenhados, por exemplo, em combater aborto e casamento gay, exigir o fechamento de exposições de arte que julgam imorais e reivindicar mais direitos para as igrejas e o ensino do Criacionismo nas escolas, mas não os verá demandar de chefes de Estado que todo armamento bélico seja destruído e o orçamento militar redirecionado para projetos de erradicação da pobreza. Ainda que soe ingênuo, não deveria esse ser o objetivo número um das religiões que alegam ser representantes do Criador do Universo?

Todos os anos tem lugar a Marcha Para Jesus. Ela reúne milhões de evangélicos que jamais saem às ruas para marchar, por exemplo, contra desigualdades sociais. Nenhuma denominação cristã organiza uma Marcha Contra a Fome.

Atividades caritativas e filantrópicas surgiram em consequência do Iluminismo, isto é, de a sociedade se tornar menos religiosa e mais secular.

Entre as dez primeiras duma lista das maiores entidades caritativas nos Estados Unidos, apenas uma pertence a uma organização religiosa. Madre Teresa de Calcutá recebeu muitos milhões de dólares em doações para sua organização Missionárias da Caridade, mas muita gente se pergunta onde esses milhões foram parar (há fortes indícios de que fluíram para o Vaticano), pois os pacientes de Madre Teresa, que, por considerar o sofrimento um dom de Deus, opunha-se ao uso de equipamentos modernos, recebiam “tratamento” precário e totalmente inadequado.

O que tem mais valor: fazer o bem pelo simples prazer de fazer o bem ou fazer o bem para promover uma religião e, dum amigo imaginário, receber algo em troca?

O mundo foi regido pelo pensamento religioso por muitos milhares de anos. As religiões tiveram, portanto, tempo mais que suficiente para provar que funcionam. Pode haver prova maior de que religião não funciona que guerras?

Enquanto outras ideologias também podem produzir todo tipo de maldades, apenas a religião se fundamenta no sobrenatural, divino, assim se colocando em posição privilegiada, isentando a si mesma de crítica e autocorreção. “Se você tem o controle sobre a verdade última e crê que essa verdade vem de Deus, você está numa situação muito perigosa, porque então é seu dever impor essa verdade ao resto do mundo. Por isso é que religião é algo mau.” — Jerry Coyne (Professor de Biologia da Universidade de Chicago, num debate, em 2011)

Se uma única incoerência é suficiente para me fazer não admirar uma pessoa, como seria eu capaz de adorar uma divindade, por exemplo, que mandou apedrejar quem recolhesse lenha no sábado? Crer não é virtude. Se o que é incoerente merece ser rejeitado, quanto mais o que é perverso!

É mais fácil compreender por que o Universo e a vida são do jeito que são, com tudo que há de bom e mau, belo e feio, sem o mágico invisível que bota comida na mesa de crentes, mas não está nem aí para a fome de milhões de crianças, que cura alguns fiéis, mas não está interessado em erradicar a doença.

Há muitas possibilidades: Deus não existe. Deus morreu. Deus existe, mas não interage com sua criação. Deus é a Natureza. Deus é mau. Existe mais de um deus. Existe só um deus, você crê em Yahweh, o deus da Bíblia, mas Alá, o deus do Alcorão, é o deus verdadeiro (e vice-versa). Você crê em Yahweh ou Alá, mas Nhanderuvuçu, o deus tupi-guarani, é o deus verdadeiro. Você crê no deus verdadeiro, mas segue a religião falsa: Yahweh é o deus verdadeiro, você segue o Judaísmo, mas o Cristianismo é a religião verdadeira (e vice-versa). O Cristianismo é a religião verdadeira, você segue o Catolicismo, mas o Protestantismo é o Cristianismo verdadeiro (e vice-versa). O Protestantismo é o Cristianismo verdadeiro, você é membro da Igreja Luterana, mas a Igreja Evangélica Jesus É Lindo e Cheiroso é o Protestantismo verdadeiro. Você é membro da Igreja Evangélica Jesus É Lindo e Cheiroso, mas a Igreja Evangélica Jesus É Lindo e Cheiroso Movimento de Reforma é a Igreja Evangélica Jesus É Lindo e Cheiroso verdadeira.

Como poderia ser sábio ter uma visão pré-fixada, unilateral e inflexível sobre a mais complexa de todas as coisas: a vida? Religiões iludem seus seguidores com falsas respostas, impedindo-os de encontrar a verdade, que pode ser só individual. Se o famoso sentido da vida existe, não pode ser externo, imposto de fora. Cada pessoa tem, ou não, de encontrar o sentido de sua própria vida, ou seja, dar-lhe sentido. Religiões não têm moral para ditar o que é certo. Se o que você faz o faz feliz e não faz mal a pessoa alguma, então é certo.

É provável que sempre haverá quem prefira ter a mente aprisionada a livre. Afinal, religião é uma prisão agradável: seus presos não precisam pensar e descobrir por si mesmos e a ideia de povo escolhido os faz sentirse especiais. Contudo, a consciência de ser intelectualmente honesto é deveras gratificante.

Livre-pensador é alguém que, na busca da verdade, não confia em revelação, tradição e autoridade, mas em evidências, lógica e razão. Se a Humanidade pode ser salva e este Pálido Ponto Azul transformado num lugar realmente bom para viver, pelo menos sem pobreza e guerras, então não por pessoas que veem a vida como sem valor e passam-na sonhando com mansões de ouro num mundo imaginário, e sim por pessoas que não fogem da realidade e são guiadas não por primitivos seres mitológicos, mas pela razão: livres-pensadores.

Quem nunca foi membro de igreja, ou duma saiu com facilidade, não consegue imaginar que o Cristianismo possa causar traumas psicológicos. Vê a religião de Jesus como inofensiva. A verdade é que o Novo Testamento ensina também coisas com o potencial de gerar transtornos emocionais e que podem continuar a assombrar pessoas que já saíram da igreja. Livrar-se da igreja é relativamente fácil, comparado a libertar-se da estrutura psicológica da religião cristã.

A ameaça de castigo infernal é uma arma para impedir você de fugir da prisão religiosa. Como num relacionamento abusivo, a religião põe a culpa em você e o manda se esforçar mais. A religião passou anos intoxicando você. Então, desintoxicar-se dela leva tempo.

Ainda que se sinta só, você não o está. Muita gente passou pelo que você está passando. Algumas compartilham sua experiência em livros ou na internet. Religiões têm muito em comum com ditaduras. Não querem que você saiba demais, descubra seus podres. Pesquisar a história das igrejas acabará com o último resquício de encanto que você ainda possa ter pela sua.

Você, agora, é livre para adquirir conhecimento, por exemplo, em História, Filosofia e Ciência. Desfrute essa liberdade. A vida é uma aventura. Então, aventure-se. Abra-se para novas experiências e amigos.

Perfeição não existe em lugar algum do Universo. Logo, neste planeta também não. Ele, porém, é nosso mundo. Sua casa é a Terra e sua família, a Humanidade. Melhorar o mundo depende de nós. Junte-se a outros para tornar nossa casa um lugar mais agradável. Em vez de julgar as pessoas, busque apreciá-las.

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