O ATEU E O SÁBIO, de Voltaire

 


A HISTÓRIA DE JENNI ou O ATEU E O SÁBIO
Voltaire

[Eu li o livro Não tenho fé suficiente para ser ateu, de Norman Gei e achei extremamente fraco; li o livro Cândido ou o otimismo, de Voltaire e achei muito bom. Por isso quando “trombei” com esse livrinho chamado A história de Jenni ou o ateu e o sábio, de Voltaire, fiquei curiosa, comprei e o li em poucas horas. O que tenho a dizer é que esse livro, infelizmente, tem mais em comum com o livro do Norman Gei de que não gostei do que com esse outro, do mesmo Voltaire, que me agradou demais. Com trechos tirados do livro e meus comentários, entre colchetes, tento explicar por que achei esse livro tão ruim]
– O volume que li pertence à Coleção Grande Obras do Pensamento Universal, da editora Lafonte (São Paulo - SP). Publicado em 2021.

Narradora
[Parece ser uma criada que acompanha o teísta e “testemunha” todos os acontecimentos da história narrada]

Começamos a fazer novenas à Santa Virgem de Manreza, o que é seguramente a melhor maneira de se defender. – 8

Dona Boca Bermeja, que tinha a honra de ser amante do reverendo padre inquisidor. – 8

As cabeças mais frias são as mais exaltadas nas grandes ocasiões. – 11

Teísta
Que lhe importa se um homem tem ou não um prepúcio e que celebre a páscoa na lua cheia ou no domingo seguinte? – pág. 12
[O personagem se mostra quase tolerante; ou até bastante tolerante, para a época; depende de como você interpreta]

Somos, você e eu, da mesma família, com a pequena diferença de que nós, ingleses, lemos o testamento de nosso avô em nossa própria língua e de que lhes é proibido lê-lo na sua. – 15

Não há uma única passagem nos Atos dos Apóstolos em que Pedro seja considerado como mestre de seus companheiros e do paulo-post-futuro. – 16

Não é nessas histórias, por mais autênticas que sejam, que baseamos nossa religião; é no Evangelho. – 17
[Aqui fica claro (acho) que ele é anglicano]

Concílio de Éfeso, para saber se Maria pudesse ser ao mesmo tempo mãe de Deus Pai e de Deus Filho. – 18
[Sugere que ele não tem a ICAR em muito boa conta]

O Evangelho não trata dessa questão e São Paulo nunca escreveu o nome Trindade. – 19

Essas são máximas de Jesus. São tão verdadeiras que nenhum legislador, nenhum filósofo jamais teve outros princípios antes dele e que é impossível que haja outros. – 20
[“nenhum” é muito pouca gente! Não sou especialista, mas apostaria que a História não teria muito trabalho pra desmentir isso]

Na economia judaica o celibato era uma espécie de infâmia. – 21
[Já vi esse argumento usado para dizer que um Jesus histórico, caso tenha existido, quase certamente seria casado]

Aí está por que poderia nomear igual ou maior número de antigos bispos casados do que vocês tiveram outrora de bispos e papas concubinos, adúlteros ou pederastas. – 22

Bacharel
Quero casar com uma mulher honesta que sempre fingirá me amar, enquanto eu for jovem, que cuidará de mim na velhice e a quem vou enterrar com todas as honras, se eu lhe sobreviver. – 22/23
[Não tem relação com o debate, mas achei engraçado]

Narradora
Montecuculli diz que três coisas são necessárias para mover guerra: 1º. dinheiro, 2º. dinheiro, 3º. dinheiro. – 25

Teísta
A fornicação entre duas pessoas livres foi talvez outrora uma espécie de direito natural do qual Jenni pode gozar com discrição sem que eu me intrometa. – 26/27

Narradora
Jovens ateus, a quem as próprias libertinagens haviam persuadido de que “o homem nada tem de superior ao animal e que não há nada de bom e sensato senão em se alegrar em suas obras e em viver com aqueles a quem se ama”. – 28
[Por que Voltaire escolheu criar ateus que podem ser criticados com tanta facilidade?]

Wirburton, malandro maldoso e muito desavergonhado. – 28
[Esse é o ateu de Voltaire]

Os ímpios concluem que a nossa, fundada na judaica, também é falsa e que sendo falsa a nossa, que é a melhor de todas, todas as outras são mais falsas ainda. Disso alguns chegam a concluir que não há Deus. – 28

Wirburton é um intrigante e um caluniador. Imaginem que perigo! – 28

Outro louco chamado Needham imagina que não foi Deus quem criou o homem; que se pode muito bem viver sem Deus; que não há Deus. – 28/29

É uma coisa espantosa o domínio que esse homem tem sobre si mesmo. Sua razão comanda seu coração como um bom patrão manda no criado. – 31
[E esse é o religioso de Voltaire]

Ateu
Aqui estou para perdoar teu pecado. Um livrinho prova que não há Deus nem vício nem virtude. – 32
[O tal livrinho capaz de perdoar pecados me fez lembrar o clero que vendia as indulgências]

Teísta
Não há felicidade sem a virtude. – 33
[Há sim! Basta que o egoísmo, o egocentrismo, a falta de empatia ou o fanatismo impere, a História está cheia de exemplos]

Narradora
Celebrou o casamento de Boca Bermeja com o bacharel da Catalunha, por quem ela sentia uma inclinação secreta, apesar das lágrimas que havia derramado por Jenni: de fato, tudo isso se combina maravilhosamente nas mulheres. – 33
[É o machismo de Voltaire? da época? ou sou eu que “vejo machismo em tudo”?]

Era como aquele índio convidado por um anjo a colher um fruto celeste e retido pelas garras de um dragão. – 34
[Não lembro de nenhuma história assim. Procurei no Google e também não achei. Se alguém souber e quiser me informar, agradeço]

Se ao menos fossem ateus honrados, como Epicuro e Leontium, Como Lucrécio e Memmius, como Spinoza, que dizem ter sido um dos homens mais honestos da Holanda; como Hobbes, tão fiel a seu desafortunado monarca Carlos I... Mas!.... – 35
[Pelo menos ele admite que existem “ateus honrados”. Não conheço todos os citados, mas que eu saiba Spinoza não era ateu]

Indígena
– Eu? – respondeu. Eu sou da minha. Por que haveria de querer que eu fosse da religião de outro homem? – 40

Aquele que partiu de minha casa com minha filha não raptou minha querida Paruba. Seria um roubo. É um grande pecado roubar o bem alheio. – 40
[Mulher como propriedade?]

Teísta
Sou tentado a crer que Deus age às vezes por meio de uma providência particular, uma vez que pune na América os crimes cometidos na Europa. – 42
[E com injustiça porque muitas vezes não pune crimes cometidos em nenhum dos lugares. Mas disso o teísta não falaria, é claro]

Indígena
Jamais fumamos contra ele nem contra seus filhos. – 43

Narradora
Observou que o costume de devorar mulheres era indigno de tão brava gente, eles não deviam ser antropófagos. – 44
[E, depois de muito pouca objeção, a tribo obedeceu! Voltaire não me pareceu nada verossímil aqui]

Indígena
Vocês os dão de comer aos vermes. Nós queremos ter a preferência; nossos estômagos são uma sepultura mais honrosa. – 44
[Se o religioso era tão sábio e racional assim, por que não aceitou essa fala como racional? Por que não argumentou racionalmente contra ela? A mim me pareceu uma mostra de preconceito contra os indígenas. Enfim, os preconceitos não faltam, seja nos personagens, seja (aparentemente) no autor]

Narradora
Segundo os melhores historiadores, os judeus devoravam as carnes sangrentas dos romanos assassinados por eles no Egito, em Chipre, na Ásia, quando de suas revoltas contra os imperadores Trajano e Adriano. – 45
[Não sei nada sobre isso, mas imagino que Voltaire deva ter sabido algo]

Ele lhes mostrou que esses festins, onde é servida a carne dos próprios semelhantes, são refeições de abutres e não de homens;
[Ele explicou por que seria comparável?]
que esse execrável costume inspira uma ferocidade destrutiva do gênero humano;
[Gostei desse argumento, mas falta desenvolvimento, portanto não dá para saber se é bem fundamentado]
era a razão pela qual eles [os indígenas] não conheciam nem as consolações da sociedade nem o cultivo da terra.
[Isso não é argumento, é falácia, é mentira, é puro preconceito]. – 45

Ateu
Pensa que exista, não sei onde, um ser continuamente ocupado em punir todas as mulheres malvadas e todos os homens perversos que povoam e despovoam os quatro cantos de nosso pequeno mundo? – 46
[Embora a realidade o negue, é exatamente isso que muitas pessoas religiosas parecem pensar]

As discussões metafísicas se assemelham a balões cheios de vento que os combatentes atiram um contra o outro. As bexigas estouram, o ar escapa e não sobra nada. – 49
[De certa forma é assim mesmo. Mas o ar que escapa pode ser tóxico, inodoro ou perfumado, acho]

Teísta
Para saber se há um Deus, só peço uma coisa: abrir os olhos. – 50
[Eu poderia inverter e dizer: “Para saber que NÃO há um Deus só peço uma coisa: abrir os olhos”, mas um ateu fajuto como esse do livro jamais poderia dizer isso. Afinal, ele está aqui com o único propósito de fazer o teísta parecer correto e cheio de razão]

Ateu
O senhor recorre a esse velho e tão batido argumento de que todos esses astros inumeráveis, colocados nas profundezas do espaço, obedecem às leis matemáticas descobertas e demonstradas pelo grande Newton. Realmente é necessário que tudo o que existe deva estar numa ordem qualquer. Gostaria de que eu adotasse um ser eterno, infinito e imutável, a quem aprouve, não sei em que tempo, criar do nada coisas que mudam a todo instante e fazer aranhas para destripar moscas? Não acreditarei em charlatães que vendam caro suas drogas a imbecis. – 50/51
[Ele fala que não acreditará, mas acaba acreditando porque é exatamente esse tipo de argumento batido que o “sábio” usa e com o qual o convence. Como deve ser convencido o ateu totalmente fake que foi criado justamente para isso]

Teísta
Pense em como esses globos imensos, que vê girar em sua imensa corrida, observam as leis de uma profunda matemática: há pois um grande matemático. – 51
[E aí está! O teísta começa a fazer exatamente o que o ateu disse que faria; e, ao contrário do que se esperaria de um ateu de verdade, esse ateu fajuto “engole” com a maior facilidade!]

Não pode ser executado por mãos humanas. Julgue, pois, qual é o poder, qual é o gênio do eterno arquiteto. – 52
[Aí vem o outro argumento batido. A falácia da ignorância: Se eu não sei o que é, então é deus. A falácia das mais óbvias, e o ateu fajuto engole sem nenhum protesto!]

Narradora
Sentiram-se igualmente tocados pela verdade e ergueram as mãos para o céu. 
– 52
[O convencimento fácil dos ouvintes que também preferem “engolir” toda e qualquer falácia. Mesmo, de acordo com a narradora, tendo ateus entre eles. Voltaire chega a parecer desonesto aqui

Teísta
Volta agora os olhos para si mesmo; não pretendo dar aqui uma lição de anatomia. Tudo é arte, tudo é preparação, meio e fim. Cada animal dá testemunho do supremo fabricador. A menor erva basta para confundir a inteligência humana. – 52
[De novo o “Se não sei o que é então é deus”; e, mais que isso, “Se não sei é o meu deus. Que tipo de ateu real aceitaria argumentos tão rasos?]

A assembleia sentiu a verdade dessas provas. – 53
[Que provas? Ele não provou nada!]

Nós não fazemos nada; nada podemos fazer; o que nos é dado é organizar, unir, desunir, numerar, pesar, medir. Só mesmo o ser necessário, o ser eternamente existente por si mesmo é quem faz. – 53
[Mais um pouco de “Se eu não sei é deus”. Balela que chega a irritar!]

Vangloriam-se de criar ouro, mas seriam incapazes de criar lama. – 53
[Aqui ele fala a respeito dos alquimistas. E está certo, claro. Mas como isso prova a existência de Deus?]

Há um ser supremo, necessário, incompreensível, que nos fez. – 53
[Se é incompreensível, por que ele fala de tal deus como se soubesse tudo a respeito dele? É só mais um dos argumentos batidos que não expressam nada além de uma crença.]

Ateu
E onde está esse ser? Devemos nos esconder depois de ter feito o bem? – 53
[Feito o bem? Um ateu pouco mais crível discutiria esse “feito o bem” em lugar de ele mesmo dizê-lo]

Por que e como um Deus teria criado do nada este universo? Sua bíblia jamais disse que Deus tenha feito o céu e a terra com absolutamente nada. – 54
[Pelo contrário, a fuga e casamento de Caim até sugere que existia o mundo antes do mundo mitológico criado pelo deus dos judeus. Mas disso o ateu fajuto também não fala]

Teísta
Já lhe provei, acho, que existe uma inteligência suprema. – 54
[Ele diz e o ateu aceita! Não discute isso, como se o religioso realmente tivesse provado a tal inteligência suprema, o que ele absolutamente NÃO fez!]

Sei que ele existe, que faz tudo, que tudo devemos esperar de sua bondade. – 54
[Antes de falar em bondade (da qual não se vê provas), deveria ter provado a existência. E o ateu fajuto nem discute isso!]

Ateu
De sua bondade! Lance somente um rápido olhar sobre a terra inteira e conclua se seu Deus é bom. – 54
[Depois de aceitar uma prova que não existiu, o ateu fajuto vai aceitar também a bondade que não se vê. Que merda de debate é esse?]

Que alimento e que abrigo tinham todos esses pobres americanos do norte, quando os descobrimos depois de tantos séculos? – 55
[Aqui o ateu fajuto mostra que partilha dos preconceitos e falsas “verdades” do teísta. Usa a dominação e o roubo de terras (ignorando os extermínios) dos povos originários para justificar a “bondade” dos europeus. Da mesma forma absurda e sem sentido, mais adiante, aceitará como verdade a pretensa bondade de deus. Afinal, que importância tem a vida, a liberdade, a cultura de um povo assim tão inferior?]

Povos arrastam sua vida, tão curta quanto insuportável, numa miséria terrível, no meio de suas neves eternas. Os mais belos climas são expostos sem cessar a flagelos destruidores. Precipícios excitantes, recobertos de terrenos férteis, que são ciladas de morte. Seu Santo Agostinho nos informa que um só terremoto, na Líbia, sacudiu e arrasou cem cidades inteiras; esses vulcões abalaram toda a bela Itália. Somos, portanto, animais absolutamente imperceptíveis; e no entanto somos esmagados por tudo que nos cerca. Que diremos desses mares de areia que atravessam o meio da África, cujas vagas engoliram exércitos inteiros? De que servem esses vastos desertos ao lado da bela Síria? De tão inabitáveis. Não é ainda bastante que o homem, essa nobre criatura, tenha sido tão mal alojado, tão mal vestido, tão mal alimentado. Nasce entre a urina e a matéria fecal para respirar dois dias; seu corpo, formado com uma arte inútil, está à mercê de todos os males que resultam dessa mesma arte; não há ninguém que possa reter na memória a lista de todas as doenças que nos perseguem. – 56
[Parecia que ia bem, se não tivesse chamado o homem de “nobre criatura” e se não tivesse mudado de opinião tão rápido. Como faz todo ateu fajuto, que foi claramente criado para “apanhar” do personagem teísta. Esse também aceitará logo mais a “bondade” do deus cuja existência sequer foi provada]

Teísta
Há muito mal físico; não subestimo sua existência; mas o senhor Birton a exagerou demais. Este clima foi feito para vocês, e não é tão mal assim, uma vez que nem vocês nem seus compatriotas jamais quiseram deixá-lo. – 57
[Que argumento de merda é esse? Porque um povo permanece em sua terra natal ela é boa? Esse talvez seja o pior dos argumentos em meio a tantos argumentos ruins!]

Deus fez cada espécie da animais e de vegetais para o local em que se perpetuam. Os negros, essa espécie de homens tão diferente da nossa, nasceram de tal modo para sua pátria que milhares desses animais negros se suicidaram, quando nossa bárbara cobiça os transportou para outros lugares. – 58
[Digo de novo e com mais força: QUE MERDA DE ARGUMENTO É ESSE? O teísta “bondoso” mostra seu racismo, ignora totalmente os maltratos e as torturas que as pessoas roubadas de suas terras e escravizadas sofriam e vem sugerir que essas pessoas cometiam suicídio porque não queriam sair de sua pátria? E pensar que Voltaire chamou esse cara de sábio! Me senti enojada]

O senhor cita Santo Agostinho, considere que esse passou a vida a se contradizer. Ele não disse ter visto na Etiópia raças de homens providos de um grande olho no meio da testa, como os ciclopes, e povos inteiros sem cabeça? – 58
[Como piada e crítica à ICAR esse argumento ficou muito bom. Mas para amenizar as destruições causadas pela natureza (que foi o argumento do ateu), não funciona nada bem]

Dentre cem mil casas, não se pode contar se não uma, no máximo, destruída a cada século pelos fogos necessários à formação deste globo. Esse fogo obedece às leis gerais estabelecidas pelo próprio Deus. – 59
[Isso é argumento? Para a bondade de um deus onipotente? Nem acredito que o número seja tão baixo, mas aceitando que seja, ainda assim caberia a pergunta: Que raio de onipotência e bondade é essa que mata ou permite que se mate? Não há justificativa lógica cabível para isso!]

Se um homem tivesse inventado uma máquina hidráulica que regasse toda uma província e a tornasse fértil, haveriam de recriminar que a água que lhes proporciona viesse a afogar alguns insetos? – 59
[Ele está comparando o homem impotente a um deus onipotente? Ele está comparando pessoas a insetos como se até aqui tivesse dado o mesmo valor a ambos? Que merda de argumento a favor da bondade do onipotente é esse? E o ateu fajuto parece nem notar o absurdo!]

Já lhe provei que a máquina do mundo é obra de um ser soberanamente inteligente e poderoso. – 59
[Não provou não!]

Essas doenças tão cruéis vêm quase todas por nossa culpa ou por culpa de nossos pais que abusaram de seus corpos e não por culpa do grande artífice. – 59
[Sério mesmo que estou lendo isso de um Voltaire? O teísta começa por colocar a culpa da falha da criação na própria criação, eximindo o criador que, em qualquer raciocínio realmente lógico, seria o responsável por tais falhas; depois ignora a existência da totalidade dos vermes, bactérias, vírus e fungos, dentre outras maneiras de se adquirir doenças, para inocentar o deus que teria criado todos esses patógenos. Esse argumento é ridículo, e é absurdo que um ateu o aceite; ainda mais com tanta facilidade quanto acontece nesse livro]

Ateu
Se existisse um deus tão poderoso e tão bom, não teria posto o mal na terra; não teria devotado suas criaturas ao sofrimento e ao crime. Se não pôde impedir o mal, é impotente; se não o quis, é bárbaro. – 60
[Aqui o ateu faz uma boa paráfrase de Epicuro. Pena que, pela facilidade com que aceita as balelas do teísta “sábio”, parece que nem ele mesmo ouve e entende o próprio argumento]

Degolamos de um extremo a outro da terra e fomos bastante imbecis para dar o nome de grandes homens, de heróis, de semideuses, de deuses até, àqueles que mandaram assassinar o maior número de seus semelhantes. Trucidaram para roubar lama amarela endurecida, que só serviu para despovoar e empobrecer a Espanha, pois a levou a negligenciar a verdadeira lama que sustenta os homens quando cultivada. Se o ser fantástico e ridículo chamado demônio tivesse querido fazer homens à sua imagem, os teria formado de outra maneira? – 60/61
[Mais argumentos muito bons que o próprio ateu parece não perceber. Uma pena que seja um ateu fajuto; fico imaginando o que uma mente aguçada como a de Voltaire faria se resolvesse criar um ateu mais próximo da realidade]

Teísta
Existe um ser supremo; eu o provei. – 62
[De novo tenho que dizer que ele não provou coisa nenhuma?]

Todos esses males não podem impedir que Deus exista. É impossível que um Deus não seja bom, mas os homens são perversos;
[Ele fala como se não tivesse afirmado que deus é um poder supremo e que esse poder supremo teria criado o homem com todos os seus defeitos]
fazem um detestável uso da liberdade que esse grande ser lhes deu e deve lhes ter dado, sem o que não passariam de simples máquinas formadas por um ser mal.
– 62
[E lá vem o velho argumento do “robozinho”! Argumento extremamente pobre; que não se sustenta nem diante da realidade, onde não vemos a liberdade que o justifique; nem diante do “onipoder” atribuído ao ser cuja existência o teísta pretende defender, porque tira dele o poder de criar seres livres que não pratiquem nem sejam vítimas do mal; ou pelo menos de tanto mal

Se o crime está em toda a terra, nela está também a virtude. – 62
[É uma verdade, mas o que ela prova além dela mesma?]

Todos os cidadãos são iguais, todas as consciências são livres, todas as religiões são boas, contanto que se adore um Deus. – 64
[Que rosário de sandices!]

Ateu
Se Deus fez tudo, os venenos são obra dele. – 64
[Pois é, né ateu fajuto? E mesmo assim você cai na conversa de que existe um “deus bonzinho” que o teísta nem provou!]

Teísta
Deus governa o mundo por meio de leis gerais. Deus não comete nem ordena nem permite o crime. – 64
[E parece que seu deus também não tem poder; uma vez que o crime existe. Será que as tais “leis gerais” são mais poderosas do que o seu deus todo poderoso? Se é assim, então de que ele serve?]

Sua providência geral seria ridícula se baixasse a cada momento em cada indivíduo. – 65
[Não seria menos ridícula do que esse seu “onipoder”. Um “onipoder” que não pode sequer evitar o que esse deus não quer que aconteça. Fora isso, se existisse e fosse tão bom e poderoso assim, ele não precisaria “baixar a cada momento em cada indivíduo”, bastaria ter criado direito logo no começo]

Ele morreu porque as leis gerais emanadas da onipotência tinham de tal modo arranjado a matéria que a fístula do ânus devia acabar com a vida desse herói (Henrique V) – 65
[Essa nem vou comentar, só digo que ri muito. Essas tais “leis gerais” são poderosas mesmo!]

Todo mal moral da ação criminosa é efeito da liberdade de que o homem abusa. – 65
[Lá vem de novo essa balela do livre-arbítrio que só vale para o algoz!]

A existência de Deus está demonstrada. Deus existe, basta; se ele existe, é justo. – 65
[O teísta insiste tanto em afirmar que provou a existência de Deus que fica parecendo que nem ele mesmo acredita nessa mentira. Parece que até o teísta inventado está achando o ateu inventado fajuto demais]

Ateu
Não poderia ter feito de tal modo que suas leis gerais não trouxessem tantas desgraças particulares? – 66
[Esse ateu é tão fajuto que aceita uma prova que não houve e quando faz uma pergunta tão boa quanto essa não exige resposta lógica a ela; aceita qualquer resposta falaciosa, falsa ou vazia que o teísta dê]

Teísta
Essa estrela que está vendo se encontra a mil e duzentos milhões de passos de nosso sol. – 68
[Tem alguma estrela tão perto assim? Sou muito ruim em matemática e nem tentei fazer o cálculo, mas acho que essa estrela está perto demais. Será que estou enganada?]

Ateu
Há um Deus, concordo com o senhor. – 68
[Assim tão fácil? Pois é! Esse é o típico ateu fajuto]

Epicuro, admitindo deuses, tinha razão em ensinar que eles não se misturavam de modo algum com nossas tolices e com nossos horrores; que não podíamos nem ofendê-los nem lhes agradar; que não tinham nenhuma necessidade de nós, nem nós deles: o senhor admite um Deus mais digno. – 68
[Digno? Pois é, o ateu fajuto está a um passo de achar o deus do teísta digno!]

Mas se diz que esse Deus formou o mundo e também nós para sua glória; que exigiu outrora sacrifícios de bois para sua glória; que apareceu, para sua glória, sob nossa forma de bípedes etc. O amor da glória não é outra coisa que orgulho e o orgulho não passa de vaidade; um orgulhoso é um tolo. – 68
[Mais uma fala muito boa do ateu fajuto, que por ser fajuto não a explora!]

Não me diga que viveremos eternamente quando não existirmos mais. Os judeus jamais suspeitaram sequer dessa imortalidade da alma. Sabemos ao menos se possuímos uma alma? Os animais, essas criaturas tão incompreensíveis como nós, possuem uma alma? – 69
[E aqui o ateu fajuto aponta a incoerência no próprio livro que o teísta disse seguir. Mas, de novo, por ser fajuto, não explora]

Ele nos falou? – 70
[Pergunta cabível que não terá resposta cabível]

Teísta
Sim, pela voz de sua consciência. – 70
[Prova?]

Ateu
Deus me haveria de punir eternamente por me ter entregue a paixões que ele me deu? – 71
[De novo o ateu fajuto faz uma boa pergunta. Que não terá uma boa resposta]

Teísta
Os brâmanes foram os primeiros que imaginaram uma prisão eterna para as substâncias celestes que se haviam revoltado contra Deus em seu próprio palácio [Deus com palácio, como os reis]; ele as encerrou numa espécie de inferno que chamavam ondera; mas, ao cabo de alguns milhares de séculos, suavizou suas penas, os colocou na terra e os fez homens; é daí que vem nossa mescla de vícios e de virtudes, de prazeres e de calamidades. – 71
[Belo mito, que não prova nada nem responde nada]

Há em nós qualquer coisa que pensa e que quer. – 73
[Sim! O cérebro]

Sempre se quer destruir aquilo que se teme. Não esperar de Deus nem castigo nem recompensa é ser verdadeiramente ateu. – 74
[Sim, se somado a isso tiver a certeza (que só pode ser derrubada mediante prova) de que a causa de não haver castigo ou recompensa é o fato de que tal deus não existe. Mas se a pessoa acredita em um deus que não castiga nem recompensa, ela não é ateia]

A crença num Deus remunerador das boas ações, punidor das más, perdoador das faltas leves é, pois, a crença mais útil ao gênero humano. – 75
[Nem há certeza de que essa crença é útil, nem essa utilidade (caso exista) é prova de existência de deus]

Sempre notei que se pode curar um ateu. – 76
[Ateísmo não é doença! Além disso, ateu fajuto como esse qualquer religioso ignorante “cura”]

O ateu violentará Ifigênia prestes a desposar Aquiles,
[Fará o mal por que e enquanto é ateu, mas depois de “curado”, e por que pode ser “curado” será bom e não “pecará” mais. Essa fala do teísta reforça o estereótipo do ateu como uma pessoa má]
mas o fanático a degolará piedosamente sobre o altar. – 76
[Fará o mal com a mais firme convicção de que está fazendo o bem. Quanto a isso eu concordo com o teísta, o fanático é mesmo capaz de agir assim]

Que mal lhes pode fazer a adoração de um Deus junto com a felicidade de ser um homem honrado? – 76
[Por que ser honrado não bastaria? Porque para o teísta ateu é sinônimo de pessoa má]

Podemos ser acometidos de uma doença mortal neste momento em que lhes falo: quem de nós não desejaria então ter vivido na inocência? – 76
[Lá vem uma versão da aposta de Pascal! Tão pouco convincente e tão amplamente usada]

Podem estar seguros de que, de todos esses monstros, não há nenhum que não tenha vivido nos tormentos do remorso e que não tenha terminado no pavor do desespero. – 76
[O teísta de Voltaire, como é muito comum nos teístas em geral, afirma “verdades” sem provar, como se fossem informações válidas. Se isso aconteceu com os poucos personagens citados, quem prova que acontece com as pessoas reais? E como ficam os psicopatas nesse argumento?]

Observação final
Até mesmo alguém como Voltaire cai na armadilha de, ao construir um diálogo entre ateu e religioso, inventar um ateu MUITO fraco e nada convincente. Assim como acontece no livro Não tenho fé suficiente para ser ateu acima citado e no filme Deus não está morto, que fez tanto sucesso entre os teístas a ponto de merecer um Deus não está morto 2, nesse livro também encontramos um ateu totalmente caricato, apenas útil para dar aparência de validade e de racionalidade aos argumentos fracos do teísta. Um teísta que, nesse livro, a meu ver sem merecimento, é chamado de “sábio” e que só é capaz de convencer quem já está convencido.




 

 

 

 

 

 


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