A SENHORA DE WILDFELL HALL - Anne Brontë



Considerava a ambição como o mais seguro caminho para a ruina, e qualquer mudança apenas um termo para substituir a palavra perdição.

— Há de tratá-lo como se fosse uma moça, deformar-lhe o espírito e torná-lo amaricado.
— Servir-se-ia dos mesmos argumentos se se tratasse de uma menina?
— Com certeza que não.
— Não; acharia que ela devia ser carinhosa e cuidadosamente protegida, como uma planta de estufa; ensinada a esperar que as outras a dirigissem, a amparassem e a resguardassem tanto quanto possível, até contra o conhecimento do mal. Mas far-me-á o favor de me explicar por que motivo faz essa distinção? É por supor que ela não tem valor?
— Decerto que não.
— No entanto, afirma que o valor só aparece quando provocado pela tentação, e, por conseguinte, a mulher deve ver-se exposta o mais possível à tentação e até conhecer o vício ou seja o que for que com ele se relacione. Assim, chego à conclusão de que a julga tão essencialmente viciosa ou tão fraca de espírito que é incapaz de lutar contra a tentação; e que, embora seja pura e inocente, enquanto se conserva ignorante e sujeita, pelo facto de ser destituída de verdadeiro valor, ensinar-lhe o que é o pecado será fazer imediatamente dela uma pecadora. Na sua opinião, devemos animar os filhos a avaliar tudo pela experiência própria, enquanto as filhas não devem nem sequer aproveitar-se da experiência alheia. Ora, eu entendo que ambos devem aproveitar tanto a experiência alheia e os preceitos de uma autoridade superior, que saibam de antemão recusar o mal e escolher o bem e não ter necessidade de recorrer a experiências que lhes deem a conhecer os males.

Visto que as coisas têm de se fazer, ao menos que sejam bem feitas.

Já tenho ouvido contar que, para algumas pessoas, beber com conta, peso e medida é impossível, e se a abstinência é um mal com que muita gente não concorda, havemos de confessar que o excesso é muito mais nocivo.

Alguns pais há que têm proibido em absoluto a seus filhos provarem bebidas capazes de embriagar. Porém, a autoridade de um pai não dura toda a vida; as crianças têm naturalmente tendência para ambicionar o que lhes proíbem, isso é um erro, contrário até à Sagrada Escritura e à razão, ensinar uma criança a olhar com desprezo as bênçãos da Providência, em vez de fazer delas uso moderado?

É pessoa rigorosa de mais, inteligente de mais, amarga de mais para o meu gosto.

Em questões de governo de casa, só temos de tomar em consideração duas coisas: em primeiro lugar, o que devemos fazer, e em segundo, o que mais agrada aos homens da família; para as senhoras tudo está bem.

A ti compete-te fazer o que for da tua vontade e a ela compete-lhe fazer o que te agradar.
Olha, o teu pobre e tão querido pai, passados os primeiros seis meses de casados seria mais fácil passar-me pela cabeça vê-lo voar do que dar-se ao incómodo de sair do seu caminho para satisfazer um desejo meu.

Não tens uma palavra amável para ninguém; quer sejam amigos, pessoas estranhas, iguais ou inferiores, com todos é o mesmo.

Ora, se Deus queria que fosse religioso, porque não me deu uma cabeça bem-talhada para o venerar?

Ouve: eu estou cheio de fome e vejo diante dos olhos um bom jantar; vêm dizer-me que, se hoje me abstiver de comer este, amanhã me darão um banquete sumptuoso, composto de pratos dos mais finos e delicados. Ora, em primeiro lugar, não me sorriria a ideia de esperar até amanhã para aplacar a fome, tendo diante de mim os meios para o fazer; em segundo lugar, os pratos substanciais de hoje agradam mais ao meu paladar do que os acepipes que me prometem para amanhã; em terceiro lugar, não consigo ver o banquete que me vão oferecer amanhã e, portanto, quem me afiança que isso não seja tudo pura invenção do cavalheiro de cara sebenta que me aconselha a guardar-me para amanhã, dás licença, resolvo sentar-me à mesa e satisfazer os apetites de hoje, e amanhã seja o que Deus quiser. E quem sabe se eu apanharei ou não as duas coisas ao mesmo tempo?

A ele ainda eu poderia perdoar de boa vontade, mas a ela não há palavras que possam exprimir a aversão que lhe tenho.

— Mas é feliz? — perguntou, com modo muito sério.
— Tão feliz como muitos outros, suponho eu.
— É tão feliz como desejaria sê-lo?
— Ninguém neste mundo é feliz a esse ponto

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