COSMOVISÃO, EPISTEMOLOGIA E EDUCAÇÃO - José Messias dos Santos e Adilson Pereira
Explicação: Já li alguns livros na vida. Tenho o hábito de ler livros com uma caneta na mão. Depois de sublinhar o que me chama a atenção no livro, isso quando posso, digito os trechos grifados num fichamento sem critério que, até hoje esteve guardado com a intenção de ser apenas um material para a provável (ou não) necessidade de fazer uma revisão. Resolvi publicar esses fichamentos porque podem ser úteis para alguém. São palavras dos outros, mas são minhas porque fui eu quem as selecionou; e o fiz com base no meu próprio julgamento.
COSMOVISÃO, EPISTEMOLOGIA E EDUCAÇÃO: uma compreensão
holística da realidade
José Messias dos Santos e
Adilson Pereira – 2ª edição revisada e ampliada – Editora Gama Filho – Rio de
Janeiro - 1999
COSMOVISÃO
conceituação
... a condição humana se
define essencialmente por uma busca contínua de ordenação das coisas, (pág. 18)
... o modo como o ser humano
apreende a realidade, a partir do espaço-tempo em que se insere, é o que
denominamos cosmovisão. (pág. 18)
O homem: linguagem, história, trabalho e cultura
Do ponto de vista social e
cultural, o homem é um ser inacabado, (pág. 19)
... é muito mais
possibilidade do que efetivação, (pág. 19)
... o homem, a cada geração,
não pode ser o que já é. (pág. 20)
A linguagem
O mundo propriamente humano
é o mundo do sentido. (pág. 21)
Falar é criar o mundo do
sentido; (pág. 21)
A história
... liberdade humana: a
escolha incondicionada entre diferentes possibilidades. (pág. 22)
... a história é o relato da
ação de nossos antepassados, que nos trouxeram até o ponto de onde prosseguimos
incansavelmente. (pág. 22)
O trabalho
O exame da conjuntura
revela sempre as aparências, os aspectos parciais, instantâneos, imediatos,
momentos da realidade; já o estudo da estrutura mostra as raízes, os
fundamentos, a substância da realidade. (pág. 23)
O trabalho é, (...) elemento
essencial da relação dialética entre o homem e a natureza, entre o saber e o
fazer, entre a teoria e a prática. (pág. 24)
A cultura
Cultura é, antes de tudo, um
conjunto de atos concretos e simbólicos criados pelo homem para conceder um
“sentido” ao mundo e a si mesmo. (pág. 24)
... o homem é o único ser
que não se repete. (pág. 25)
O meio o influencia, mas não
o determina, (pág. 26)
... para convivermos
harmoniosamente com pessoas e grupos tão diversos culturalmente, é necessária a
prática da tolerância (pág. 26)
O mito
O mito foi a primeira
forma de conhecimento (pág. 28)
... o homem é dotado de
certas matrizes (arquétipos) ou representações simbólicas que assimilam
conteúdos vindos da realidade exterior e dão origem aos mitos e símbolos
históricos. (pág. 28)
As categorias do
pensamento mítico são a imaginação, a fantasia e a emoção. Seu objeto é
a apresentação de um conjunto de ocorrências fantásticas (...) Seus personagens
são os entes sobrenaturais (...) Sua linguagem encerra profundo conteúdo
existencial, (pág. 28 / 29)
Mito (...) É sempre, (...) a
narrativa de uma criação: ele relata de que modo algo foi produzido e começou a
ser (pág. 30)
Função do mito
Sua função é conferir
à natureza uma dimensão humana, (pág. 30)
... o mito envolve um tipo
de compreensão do real diverso da experiência racional. (pág. 30)
O mito é um ingrediente
vital da civilização humana; (pág. 31)
... o mito não implica em falsidade,
mas sim em verdade, na medida em que é apenas uma parte essencial dos
modelos de pensamento e de discurso humanos. (pág. 32)
O mito hoje
... os esforços realizados
por filósofos e cientistas para explicar o universo e “racionalizar” o
conhecimento não foram capazes de banir o mito da consciência humana, (pág. 33)
Ele está presente tanto na
consciência do homem primitivo quanto na do homem contemporâneo e se manifesta
não só sob a forma de magia, mas também como ciência, arte, religião,
filosofia, etc. (pág. 33 / 34)
O mito propõe, mas cabe à
consciência dispor. (...) De modo algum o reconhecimento dos mitos é a rejeição
da razão, a recusa da moral. (pág. 34 / 35)
De idade a idade, as formas
de expressão se renovam, mas na tapeçaria de Penélope que é a história, a trama
permanece. (...) O mito (...) Permite que o homem tome consciência, no tempo,
de sua vocação para além do tempo (pág. 35)
A religião
... o homem, além de sapiens,
sociales, faber, loquens, ludens, é também religiosus. (pág. 36)
A antropologia assinala como
caracteres que diferencia o homem dos animais a racionalidade, a sociabilidade,
a capacidade técnica, a linguagem articulada, a atividade lúdica e a
religiosidade. (pág. 36)
Manifestação do sagrado
... mito e religião, ambos
têm um núcleo comum em suas origens e desenvolvimento: a capacidade humana de
criar símbolos, (...) Através do símbolo, o homem refaz e rediz a
realidade no nível do imaginário. (pág. 36)
O espírito científico,
fortemente armado com seu método, não existe sem a religiosidade cósmica (pág. 38)
Função da religião
... a religião, longe de
alienar o indivíduo, opera da maneira mais radical a sua integração na
realidade, (...) Quanto maior é a inserção do homem na realidade, mais ela se
torna multifacetada, (...) a realidade dada ou natural é apenas o
superte da realidade propriamente humana, que é a realidade significada ou
cultural. (pág. 39)
É verdade que existem formas
de expressão religiosa que amiúdam o homem e o fazem preconceituoso, tímido,
mesquinho, bárbaro ... Mas, em sua essência, não é essa a função da religião.
(pág. 40)
O senso comum – Origem e características
... o senso comum é uma
forma de ver a realidade espontânea, fragmentária, intuitiva, acrítica,
subjetiva e assistematicamente. (...) uma forma de conhecimento sem
o rigor metodológico da ciência e da filosofia. (pág. 41 / 42)
... os órgão sensoriais
(...) têm as suas limitações e, (...) não podem revelar-nos todas as
propriedades das coisas. (pág. 43)
As sensações são as janelas
para espreitar o mundo. (pág. 43)
Como forma de saber, o senso
comum é extremamente útil e significativo porque constitui a forma de
pensamento genérico de um povo num determinado tempo e lugar. (pág. 44)
... o senso comum nos dá
apenas uma amostra superficial da realidade a partir da qual são feitas
generalizações muitas vezes apressadas e imprecisas. (...) a superação do senso
comum é necessária para atingirmos o conhecimento do real. (pág. 44)
O bom senso
Há nele um núcleo racional,
sadio, que merece ser preservado, desenvolvido e transformado em algo unitário
e coerente. Deve ser elevado ao bom senso, como visão crítica do mundo,
como senso comum depurado. (pág. 45)
... o senso comum não se
opõe à filosofia nem à ciência, mas a elas se antecipa e lhes fornece a base
sobre a qual se erigem a reflexão filosófica e a constatação científica. (pág.
45)
A filosofia
... filosofia (...) esforço
para explicar coisas e suas causas mais remotas. (pág. 46)
O processo de evolução do conhecimento filosófico
Na antiguidade, o saber
filosófico correspondia à totalidade do conhecimento racional desenvolvido pelo
homem. (pág. 47)
... a filosofia continua
tratando da mesma realidade abordada pelas ciências, (...) jamais renuncia a
considerar o seu objeto do ponto de vista da totalidade. A visão filosófica é
uma visão de conjunto. (pág. 48)
... em todos os setores do
conhecimento e da ação, a filosofia deve estar presente como reflexão crítica a
respeito dos fundamentos desse conhecimento e desse agir humanos. (pág. 48)
Natureza da reflexão filosófica
... a realidade não se dá a
conhecer totalmente nem pelo senso comum, nem pela ciência. (pág. 49)
A reflexão filosófica (...)
conscientiza o fato de que, no conhecido, há sempre um desconhecido, que no
dito, persiste um não-dito e que no sabido, existe um ignorado. (...) Ela sabe
não possuir a verdade, mas a disposição permanente de procurá-la. (pág. 49)
A presença da realidade
estimula o pensamento a fazer filosofia . (pág. 50)
Filosofar é preciso
... viver sem refletir de
forma radical, profunda (...) se isso acontecer a nível da coletividade,
o ser humano corre o risco de involuir, (...) É o que, a nível ideológico,
designamos por estado de alienação. (pág. 50)
Como especulação, a
filosofia procura captar ou apreender a realidade, (...) como prescrição ou
norma de conduta ela recomenda e prescreve valores e ideais; como crítica
ou análise, examina os conceitos, julga as idéias e assinala as
incoerências do nosso pensamento. (pág. 51)
Ideologia
Os mais loquazes são,
certamente, os que têm maiores chances de governar o corpo político. (pág. 52)
... ideologia (...) crença
na autonomia das idéias e na capacidade que elas têm de criar a realidade.
(pág. 52)
... é impossível desvincular
a ideologia do contexto sócio-político em que emerge e se propaga. (pág. 53)
A ideologia sedimenta-se e
consolida-se no momento em que se torna “senso comum”, (pág. 53)
Características
... as ideologias fixam, em
um sistema de representação mental relativamente coerente, não somente uma relação
real (as condições de existência), mas também uma relação imaginária
(inversão das condições de existência). (pág. 55)
... ideologia implica
referência a uma “realidade” que somente de maneira imperfeita, parcial ou
deformada se deixa reconstruir no pensamento. (pág. 56)
Ideologia e conhecimento
... as ideologias (sentido
negativo) são representações deformadas da realidade social. (pág. 56)
... o discurso ideológico
exerce não o poder, mas uma hegemonia que é a qualidade de liderança
intelectual e moral, capaz de gerar bases de consentimento ou de aceitação
generalizada em forma de senso comum. (pág. 58)
Tornado senso comum, o
discurso ideológico constitui-se no meio eficaz de manipulação das informações,
das condutas e dos atos políticos e sociais dos dirigentes e dos setores dominantes
da sociedade. (pág. 58)
A recusa da alienação exige discernimento
e consciência crítica. (pág. 61)
Elevada à categoria de
mitos, as ideologias tornam-se perigosas porque são capazes de arrastar
multidões a holocaustos, voluntária ou forçosamente (pág. 61)
Ter cons
EDUCAÇÃO
Educação e o tempo presente
—
A finalidade da educação é possibilitar ao educando apropriar-se de sua
realidade e adquirir uma consciência crítica da mesma. (pág. 134)
A educação ontem e hoje
—
O conceito de educação como processo implica levar em conta dois aspectos
fundamentais: a individualidade e a sociabilidade do educando. (pág. 136)
O imperativo ético de uma
mudança de paradigma
—
A educação tem que ser vista no quadro geral das transformações em que se
insere. (pág. 137)
—
Educandos e educadores são seres conscientes e livres, porém condicionados
pelos múltiplos fatores que interagem na totalidade do real. (pág. 137)
—
Método proposto por René Descartes consiste em duvidar de todo conhecimento já
estabelecido para encontrar uma verdade indubitável a partir da qual se
reconstruirá todo o saber. (pág. 139)
—
A firme crença na certeza científica passou a todos os campos do saber,
incluindo as ciências do comportamento. (pág. 140)
—
Essa concepção de ciência prevaleceu até o nosso século, quando a nova física
veio nos mostrar que não existe verdade absoluta em ciência, que todos os
conceitos e teorias são limitados e aproximados. (pág. 140)
—
A fragmentação característica do nosso pensamento em geral, e das nossas
disciplinas acadêmicas, têm sua raiz no método analítico de raciocínio
estabelecido por descartes. Esse método (...) consiste em decompor pensamentos
e problemas em suas partes componentes e em dispô-las es sua ordem lógica.
(pág. 141)
—
A ciência mecânica nos deu grande quantidade de conhecimento, mas nenhum
contexto que nos permitisse interpreta-lo ou relaciona-lo a nós ou a nossas
preocupações e interesses. (pág. 141)
—
A cosmovisão mecanicista encorajou a exploração desordenada dos recursos
naturais, causando sérios prejuízos à biosfera. (pág. 142)
—
A mesma lógica de dominação e exploração da natureza foi aplicada à sociedade
humana. (pág. 142)
—
A injustiça social engendra a injustiça ecológica e vice-versa. (pág. 142)
O novo paradigma
—
O paradigma epistemológico que emerge e ganha força atualmente é oriundo das
descobertas realizadas pela física quântica e pela biologia molecular. (pág.
144)
—
Segundo esse novo modelo, cada sistema compõe-se de subsistemas, e todos são
parte de um sistema ainda maior. (pág. 144)
—
Tudo implica tudo, nada existe fora da relação existente entre todos os seres e
todas as coisas. (...) Daí o fortalecimento da cosmovisão holística, segundo a
qual todos os seres se relacionam entre si e com o meio ambiente, numa perspectiva
do infinitamente pequeno das partículas elementares (quarks), do infinitamente
grande dos espaços cósmicos, do infinitamente complexo dos sistemas de vida, do
infinitamente profundo do coração humanoe do infinitamente misterioso do oceano
ilimitado de energia primordial (vácuo quântico, imagem de Deus) do qual tudo
promana. (pág. 145 / 146)
—
Uma das instâncias que favorece essa tomada de consciência é a educação. (pág.
146)
—
Ciência e técnica podem contribuir grandemente para o verdadeiro progresso
humano, se não se limitarem à busca da utilidade instrumental de suas
conquistas, sem medir-lhes as conseqüências éticas em todas as suas dimensões.
(pág. 147)
O enfoque interdisciplinar da
educação
—
Chegamos a um ponto em que o especialista se reduz àquele que, à custa de saber
cada vez mais sobre cada vez menos, termina por saber tudo sobre o nada.
Torna-se uma ilha de saber, cercada por um oceano de ignorâncias. (pág. 151)
A passagem obrigatória
—
A passagem do nível molecular ao nível celular é também a passagem do inanimado
ao vivo. (pág. 153)
—
A visão dos sistemas complexos substitui a imagem estática da máquina,
construída de uma vez por todas em seu estado acabado, pela perspectiva
dinâmica de um mundo em contínua criação: um sistema complexo não pára de se
construir, de se degradar, de se reconstruir e de co-evoluir em
interdependências com os sistemas que o cercam. (pág. 153)
Natureza da
interdisciplinaridade
—
Nem sempre as dimensões do real são redutíveis à mensuração e à observação
experimentadora da ciência. Em sua infinita complexidade, a realidade escapa ao
controle da ciência e da técnica, para se oferecer a outras formas de
compreensão que o saber especializado não pode captar. Daí a necessidade do
tratamento interdisciplinar, tanto na pesquisa quanto no ensino. (pág. 155)
—
Trabalhar sob a perspectiva da interdisciplinaridade é hoje um desafio a ser
enfrentado por pesquisadores e professores. (pág. 156)
A circularidade das abordagens
—
A circularidade derruba as barreiras entre as áreas de conhecimento e, a partir
de uma área, estabelece o diálogo com outra, buscando nele elementos
necessários para o alargamento explicativo do objeto ou da realidade. (pág.
159)
—
A educação não é a resposta para todos os desafios que o homem é levado a
enfrentar, mas é parte dela. (pág. 161)
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